недеља, јануар 29

NÃO SE MATE

Carlos, sossegue, o amor
é isso que você está vendo:
hoje beija, amanhã não beija,
depois de amanhã é domingo
e segunda-feira ninguém sabe
o que será.

Inútil você resistir
ou mesmo suicidar-se.
Não se mate, oh não se mate,
reserve-se todo para
as bodas que ninguém sabe
quando virão,
se é que virão.

O amor, Carlos, você telúrico,
a noite passou em você,
e os recalques se sublimando,
lá dentro um barulho inefável,
rezas,
vitrolas,
santos que se persignam,
anúncios do melhor sabão,
barulho que ninguém sabe
de quê,
pra quê.

Entretanto você caminha
melancólico e vertical.
Você é a palmeira, você é o grito
que ninguém ouviu no teatro
e as luzes todas se apagam.
O amor no escuro, não, no claro,
é sempre triste, meu filho, Carlos,
mas não diga nada a ninguém, ninguém sabe nem saberá.

Carlos Drummond de Andrade

петак, јануар 27

"isso de querer ser
exatamente aquilo
que a gente é
ainda vai
nos levar além" - Paulo Leminski

уторак, јануар 24

Percebeu que seu quarto não estava mais lá. Apesar da solidez do chão, da concretude das paredes, do amparo da cama, o ambiente estava ausente. Alguma coisa o incomodava. Alheio, o que percebia era falta: do conchego, da luz, do ruído irregular da rua, da sombra que o prédio em frente criava, dando a invenção de formas ocultas e temporárias sobre os seus livros, o travesseiro, a colcha, a cama de ferro, a sua perna. Pensou no amparo que essas coisas lhe proporcionava, uma intimidade tão íntima que se ocultava de si mesma. Ninguém sabia realmente o que se passava, naquele ambiente, entre eles. Esquecera que até no momento mais íntimo, a presença dele se fazia notar pela expressão de certos gestos, a entonação de uma conversa, uma cantada, uma trepada, tudo ali remetia para um estado que, incoerentemente, parecia sempiterno. A ausência, decerto deveria ser a primeira vez que sentia-se assim, julgou lembrar, lhe indicava que algo mudara. Desconfiou que poderia ser também alguém. "Mas quem?". Foi primeiro atrás de algo.

A água ainda não tinha gelado o suficiente, mas mesmo assim tomou-a de um gole só, voltando a despejar mais água no copo vazio. Não se lembrava a que horas pegara no sono. Se foi durante a noite, se fora durante o dia, se o que pensava era matéria dos sonhos, ou se sonhara que sonhou que tudo aquilo era um sonho. O discernimento precário, fragilizado pela sonolência e o cansaço, não facilitava muito o alinhamento dos fatos, dos pensamentos, das sensações, dos sonhos. Continuava a beber água, dessa vez com o cigarro na mão. Não sabia mais se tinha esquecido todas as coisas e entrado numa realidade virtual, infinitamente subjetiva, estrangeira a qualquer signo comum, ou se, ao invés da virtualidade, aquele momento era pura realidade, descordada, sem linha de esquecimento, de memória, de nomeação. Pendeu a cabeça para o lado, num relaxamento incerto. Visou.

Substantivo: palavra que nomeia um ser ou um objeto; uma ação, qualidade, estado considerados separados dos seres ou objetos a que pertencem; nome. Não, isso não tinha muita relevância naquela hora. Não era substantivo o seu problema.

Adjetivo: palavra que modifica o substantivo, indicando qualidade, caráter, modo de ser ou estado. Eureka! Sim, parecia que começava a entender sua gramática.

Genérico e vascilante lançou que a determinação do nome oscilava diante da imprevisibilidade do estado, do modo de ser. Mas não se convenceu muito disso (talvez pela generalidade do pensamento). Tampouco se deu por vencido. Procurou e encontrou várias gramáticas portuguesas, brasileiras ora pois, da época do colégio das aulas da professora Ademarci, para certificar que as informações sobre os substantivos e os adjetivos eram dignas de atenção. Substantivo. Adjetivo. Lia e relia as infinitas variações das definições da língua. Réquiem.

Passou pelos pronomes com desastrada curiosidade, visto que ainda não buscava nada por ali. Tinha em mente que sua caça era maior, ia além. Estava no mundo, no ambiente do quarto perdido, em algum hiato que separou suas frases de uma conclusão. Desoração.

Percebeu, passado muito tempo depois, que todo seu pensamento fora tomado pelas inésimas gramáticas que percorrera, folheara, inquirira a respeito do seu estado nos últimos tempos. A ausência do quarto era quase uma reminescência. Lânquida. Sua linguagem replicava tudo aquilo que lera esvairadamente nos livros que já não saiam do seu alcance. Mas isso não era um problema para ele, certamente. Comprava gramáticas, várias e de autores diferentes. Não acreditava totalmente em nenhuma delas, mas sempre se interessava pela intriga que parecia se assomar da leitura incessante entre todas elas juntas.

"Seu troco. R$0,25." Pensou em parar de fumar, mas agora não era a hora. Estava atolado até o pescoço com os acontecimentos dos últimos tempos para poder se livrar do cigarro, sem que isso afetasse seu humor ou concentração na tarefa de busca. Mas tudo era também uma questão de estilo. Acabava-se ao pensar que tinha que parar. Incessante, excessivo, mas vazia, sempre vazia tinha sido sua busca. Não podia se larga de nada, mesmo que nada tivesse até hoje.

"Não encontrava mais o quê?"

Ao entrar no quarto, percebeu que o cigarro transformava o ambiente de ar puro e fresco em jaula de fumaça desagradável e espessa. 'Imperfume", soltou em voz inesperada. No quarto não mais fumaria. Mas antes passara os olhos sobre alguma expressão sobre o dicionário. Não lembrava o que era, mas estava lá, aberto, visível, sempre a mostra. Íntimo.

Dirigiu-se para a sala e notou que a sala estava diferente. Estranhou aquele ambiente, não reconhecia sua sala ali. "O que sucedera?". Foi ao quarto, reuniu as gramáticas, os dicionários, os livros de ortografia, sinônimo, antônimo, manuais de escrita, redação e oralidade que comprara e iniciou sua busca no chão do desconhecido. Dessa vez chamou-lhe a atenção o pronome: vocábulo que pode substituir um substantivo ou sintagma nominal. A substituição sugeria a existência e a inexistência do próprio nome, na sua gramática a essa altura já alucinada por tantos desvãoes, espelhos. Pensou nas desistências, nas resistências, nos deslocamentos, nos arranjos, nas liações... Pensou no fim de tudo. Temeu que o pretérito mais-que-perfeito fosse sua radicalidade. "Eles se foram"... percebeu a resignação por trás da oração. Mas encontrou uma definição que não cancelava o fim das coisas, pelo menos o fim eterno, metafísico. Estava ali sua busca. Seu fim e no entanto apenas o seu começo.

Pronome recíproco: pronome átono que indica que a ação expressa pelo verbo implica uma relação mútua de causa e efeito entre os agentes indicados no sujeito. Causa?, efeito?, agente? Confuso, resolveu investigar.

(Cf. para os verbetes gramaticais o Dicionário da língua portuguesa, Aurélio)
"Já o disse em Hiroshima Mon Amour: o que conta não é a manifestação do desejo, da tentativa amorosa. O que conta é o inferno da história única. Nada a substitui, nem uma segunda história. Nem a mentira. Nada. Quanto mais a provocamos, mais ela foge. Amar é amar alguém. Não há um múltiplo da vida que possa ser vivido. Todas as primeiras histórias de amor se quebram e depois é essa história que transportamos para as outras histórias. Quando se viveu um amor com alguém, fica-se marcado para sempre e depois transporta-se essa história de pessoa a pessoa. Nunca nos separamos dele.
Não podemos evitar a unicidade, a fidelidade, como se fôssemos, só nós, o nosso próprio cosmo. Amar toda a gente, como proclamam algumas pessoas e os cristãos, é embuste. Essas coisas não passam de mentiras. Só se ama uma pessoa de cada vez. Nunca duas ao mesmo tempo."
Marguerite Duras, in "Mundo Exterior "

( (Carol minha amiga) ama essa autora, e há tempos queria lembrar de colocar este texto por aqui.Eu também gosto, principalmente gosto de ver pronunciar seu nome...mas gosto discordando,aliás como é minha forma mais presente de gostar de alguma coisa.Consigo discordar de absolutamente tudo dito sobre l´amour,e ainda assim gostar dela, por acha-la bela. Mas é absolutamente incabível em todos seus aspectos. Talvez, inclusive, o segredo desta beleza esteja aí, na sua irrealidade, irrealização, desejo para sempre inconcluso de unicidade. Pois nada pode ser mais verdade do que a própria mentira , e nada pode ser vivido que não seja múltiplo.L´amour est fou)

недеља, јануар 22



Viaducts by Paul Klee


Porque a oxidação que pode passar vários caminhos...

петак, јануар 20

Querer predizer o futuro (profetizar) e querer ouvir a necessidade do passado são uma única e mesma coisa, e é apenas um problema de gosto se determinada geração acha uma coisa mais plausível que a outra... Severino Kierkegaard me despeja sua migalha envolto no prateado pó que sustenta essa noite.
Pois tudo o que será já foi?
Não sei, as favas contadas e as águas passadas se destilam na minha mente,junto ao perfumado líquido com bolhinhas que despejo, por incompetência ou demência, e tudo fica muito fácil e muito obscuro ao mesmo tempo.
Tem um lugar e um tempo do qual a gente não escapa.
Esta música é muito alta e nada mais é do que uma cópia da cópia da cópía, lixo cultural.
Não, não vou te beijar. Passe-me o prato.
Um herói não se declara, por isso não posso dizer a vocÊs de como me sinto glórioso em minha marcha, fúnebre e ridícula.
Nenhum amor é menos ridículo do que o outro.
Eu sei, eu sei, pois, que ao amor corresponde o amável, e este é inexplicável.
Não sei se trata de amor...antes talvez, apenas de uma coincidência singular entre o trágico e o cômico.




O que faremos, já que é impossível dormir?
( )
:...!?
??
!
.
...
( )
zzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzz

уторак, јануар 17

Enfim, o fim?
Finado, fenestro, fundo, embasbacado. Por fim, apenas o fim?
fio desvelado, devorado, árduo, seco.
pra que fim?
Se findo recomeço, se morto-vivo, se calado grito, chorando rio, atenta adormeço sonhos inalcançavéis.
Perdendo eu ganho.
Certo que há um fim?
inodor, asséptico, suficiente, preciso, racional, prático, clean e funcional.
Posto que sim?
desvio, sonego, desprezo, atravesso, destrato, desdenho.Sujo, feio, barulhento, confuso,arrogante,
marcado pra morrer.
Traio minha própria finalidade.
R$ 10,00. Despedi de lance de mão. Simples adeus, para quem não suporta muito a cordialidade. Na esquina percebi que a rua não era tão longa quanto o caminho me sugeria. Hora de ir para a casa. No meio dela, no entanto, tudo se alongara. Por má sorte, deparei-me com uma Mulher, da qual já tinha uso, e a Ela, poucas vezes, me referi. Apesar de aparentemente não me interessar muito, Ela me sugeria uma conversa. "Por quê...", pensei hesitante e acautelado, deixando que minha intimidade fosse inundada por uma vontade de corpo, buraco, suor e riso. Ainda um cigarro na mão, na outra, Ela e toda a imaginação do mundo a nos afirmar. Sua fala me seduzia, pelos "s" forçados, o acento abreviado, o fim, nosso, repetidamente quase assim a escapar. Tensão e prazer, sentia Ela, me imaginava Nela e tinha uma leve irritação, decerto estava muito excitado, quando antecipava Ela, eu. Súbito. Aterrorizado por alguém que passou na rua, inopinado. "Quem era?" "Eu não posso!" "Tenho prestações, compromissos, fidelidades..." "Eu não...", toda uma série de pensamentos rápidos e judiciosos passaram por mim, naquela hora. Um turbilhão de interrogações que desfizeram minha intimidade. Agora eu era só aparência. Homem de jeans e camisa preta, cueca e sapato. Tudo me tampava, impedia, respeitava. Ela voltou a me perguntar algo que, devido o meu constrangimento com aquela situação já tramada, não ouvi direito e surdamente respondi, em tom áspero de um desatar. "Não!".

No dia seguinte acordo e percebo que Ela dorme ao meu lado, ainda descoberta, nua, maliciosa. Aquela perna... Atordoado, sem saber o que sucedera, acordei-A num gesto demente, descrente, incerto. O sol já deixava o dia quente e a previsão do dia anterior sobre as chuvas pareciam ter sido falsas. No meu quarto o cheiro de suor, sexo, colcha suja e cigarro denunciava o excessivo que sucedera à minha negação da noite anterior. Naquele momento eu me percebia só com Ela, aturdido, sim, mas só eu e Ela. Obviamente que sabia que todos estavam lá fora, o barulho me esparava para pagar as contas, ajeitar a casa, relativizar o puro caso. Percebi que o exagero da nossa intimidade desconcertou a descontrução que me civilizara na rua (civilização sugerida apenas, me lembrava disso, pela minha passada por aquele estranho naquele momento). Ela acordara sussurrando: "mais mais...!" num ritmo e sugestão que rapidamente revelaram as marcas do meu corpo. Pospor. Ouvir esse pedido e essa excitação escapando surpreendia os meus sentidos, irritados e sem tino. O corpo tem fúria. Desesperadamente, porém, eu já me via ocupado por aquele estranho, Ela, eu, nossas mãos, a rua, o buraco, as prestações, a intimidade, os R$10,00 e a hora em que sai do bar: 05:47 da manhã. Minha atitude foi talvez a mais áspera que me lembro ter tomado até hoje. Novamente Ela me fez mais uma pergunta que outra vez, desvairado, disparei (não poderia chamar aquilo de resposta) num arrazoado "Vai!".

Sentei-me na mesa, resolvi escrever. O sol batia forte. Nua e vulgarmente conhecida, me assustava a boca que me chegava fundo e a cobiça com que eu tomava o seu corpo. Uma surreal vontade poder. "O que sucedera?" Não era dia com sol e não havia Ela.

недеља, јануар 15

{(o Porto tornou-se lugar do vazio, do desencontro, da distância que a torto separa as terras de um lá de lá. não tem navio, carga, puta, guindaste, maquineiro, contêineres, lenço. nem Eu sei por quê diabos fui parar la-bas onde estou. ocaso.)

(sua periferia tem asfalto, prédio, adminstrador, criança, bar, resina: é quente, sem ser natural.)

("para quem são os adeuses?" messagio premido no próprio gesto, mail limado no apelo, na intenção, perdido, calado. )

(o Armazém me lembra uma casa antiga, pichada, despintada, rasurada, de cheiro forte e úmido, esquecida quase mesmo pelo grave barulho do mar. aquilo deixa tudo muito triste e melancólico. alguma Identidade entre o Lugar e Eu parece ter me perturbado. "por quê estar assim?", é a pergunta que faço ao Porto, ou que o Porto faz para mim. (...) uma imensa saudade de um futuro melhor separa a cidade da minha, daquela ausência. )}

субота, јануар 14

exaustão



do Lat. exhaustiore


s. f.,
exaustação;

extremo cansaço




Não, não é cansaço...
É uma quantidade de desilusão
Que se me entranha na espécie de pensar,
E um domingo às avessas
Do sentimento,
Um feriado passado no abismo...

Não, cansaço não é...
É eu estar existindo
E também o mundo,
Com tudo aquilo que contém,
Como tudo aquilo que nele se desdobra
E afinal é a mesma coisa variada em cópias iguais.
(A. de cAmpos)

петак, јануар 13

luta. relação. enter. entre. resistência. emergência. revirar-se. inscrição. marcação. contorno. perfuração. desconstrução. canção. demolição. denegação. intervenção. interferir. indeferir. indefinir. infecção. invasão. contradição. invenção. onírico. cruel. real.

oximoro.

em palavra concentro. dissolvo. (re)luto.

(para Ela)

среда, јануар 11

{Noise, Drumm, Bass (e algo inaudível para o ouvido alheio) : Wave pós-bossanova}

"Give me your eyes
That I might see the blind man kissing my hands
The sun is humming
My head turns to dust as he plays on his knees
As he plays on his knees

And the sand
And the sea grows
I close my eyes
Move slowly through drowning waves
Going away on a strange day

And I laugh as I drift in the wind
Blind
Dancing on a beach of stone
Cherish the faces as they wait for the end
Sudden hush across the water
And we're here again

And the sand
And the sea grows
I close my eyes
Move slowly through drowning waves
Going away
On a strange day

My head falls backs
And the walls crash down
And the sky
And the impossible
Explode
Held for one moment I remember a song
An impression of sound
Then everything is gone
Forever

A strange day"

(Robert Smith)

уторак, јануар 10

"O cavalo que possuo e o eu que possuo
ficaremos azuis maravilhosos e limpos
de novo
e eu sairei e
esperarei por você."

Charles Bukowski

недеља, јануар 8

Queria contemplar a ferida. Aguçar os sentidos e me enredar nesse curioso espetáculo, de uma intensidade que não lhe podiam dar nem a imaginação nem a ciência, porque a ciência é mais lenta e a imaginação mais vaga, enquanto que o que eu ali via era a condensação viva de todos os tempos.
Para descrevê-la seria preciso fixar o relâmpago.
Esta figura nebulosa, feita de retalhos,
afasta tudo que persegue.

Torna distante tudo que toca.
Flagelado e rebelde diante a fatalidade das coisas, vê a si fugir
perpetuamente.
Gozo apenas devaneios de repouso.

уторак, јануар 3

недеља, јануар 1

O que dizer sobre isto?
-Tá, é a cidade mais linda do mundo. Não precisa falar.


um ano,

Eu danço rio bebo corro sonho debocho esnobo sossego desamparo caminho aninho afago desarmo esfaqueo maltrato...
Eu nao durmo.
Achei várias vezes que o chão se modelava aos meus pés. Lembrei muito de w. benjamin.
to lendo mann.Todos me disseram que são d-efeitos colaterais. Eu ando muito bêbada.

Tá um calor dos infernos. Todos dormem. Só velhos nas ruas.Eu só precisava de uma gasosa, e qualquer motivo pra estar viva. A velha no elevador queria reclamar. A outra exigia o jornal.
Ouvi um barulho,podem ser os sonhos...