понедељак, децембар 26

Todos os homens aspiram à vida feliz e à felicidade, esta é uma coisa manifesta; mas, se muitos têm a possibilidade de alcançá-la, outros não a têm em virtude de algum azar ou vício de natureza (pois a vida feliz requer um certo acompanhamento de bens externos, em quantidade menor para os indivíduos dotados de melhores disposições e em quantidade maior para aqueles cujas disposições são piores), e outros, finalmente, tendo a possibilidade de ser felizes, imprimem desde o início uma direcção errada na sua busca da felicidade.

Aristóteles, in 'Ética a Nicómaco'

субота, децембар 24


Feliz Natal!!
"Posso imaginar-me tudo, porque não sou nada. Se fosse alguma coisa, não poderia imaginar. O ajudante de guarda-livros pode sonhar-se imperador romano; o Rei de Inglaterra não o pode fazer, porque o Rei de Inglaterra está privado de o ser, em sonhos, outro rei que não o rei que é. A sua realidade não o deixa sentir."

Bernardo Soares

среда, децембар 21

Enfim, enfim quebrara-se realmente o meu invólucro, e sem limite eu era. Por não ser, era. Até ao fim daquilo que eu não era, eu era. O que não sou eu, eu sou. Tudo estará em mim, se eu não for; pois "eu" é apenas um dos espasmos instantâneos do mundo.
Minha vida não tem sentido apenas humano, é muito maior - é tão maior que, em relação ao humano, não tem sentido. Da organização geral que era maior que eu, eu só havia até então percebido os fragmentos. Mas agora, eu era muito menos que humana - e só realizaria o meu destino especificamente humano se me entregasse, como estava me entregando, ao que já não era eu, ao que já é inumano.
E entregando-me com a confiança de pertencer ao desconhecido. Pois só posso rezar ao que não conheço. E só posso amar à evidência desconhecida das coisas, e só me posso agregar ao que desconheço. Só esta é que é uma entrega real.

Clarice, clarice...

недеља, децембар 18

Onde Será a Terra Prometida?

Triste época a nossa! Para que oceano correrá esta torrente de iniquidades? Para onde vamos nós, numa noite tão profunda? Os que querem tactear este mundo doente retiram-se depressa, aterrorizados com a corrupção que se agita nas suas entranhas.
Quando Roma se sentiu agonizar, tinha pelo menos uma esperança, entrevia por detrás da mortalha a Cruz radiosa, brilhando sobre a eternidade. Essa religião durou dois mil anos, mas agora começa a esgotar-se, já não basta, troçam dela; e as suas igrejas caem em ruínas, os seus cemitérios transbordam de mortos.
E nós, que religião teremos nós? Sermos tão velhos como somos, e caminharmos ainda no deserto, como os Hebreus que fugiam do Egipto.
Onde será a Terra prometida?
Tentámos tudo e renegámos tudo, sem esperança; e depois uma estranha ambição invadiu-nos a alma e a humanidade, há uma inquietação imensa que nos rói, há um vazio na nossa multidão; sentimos à nossa volta um frio de sepulcro.

A humanidade começou a mexer em máquinas, e ao ver o ouro que nelas brilhava, exclamou: «É Deus!» E come esse Deus. Há - e é porque tudo acabou, adeus! adeus! - vinho antes da morte! Cada um se precipita para onde o seu instinto o impele, o mundo formiga como os insectos sobre um cadáver, os poetas passam sem terem tempo para esculpir os seus pensamentos, mal os lançam nas folhas, as folhas voam; tudo brilha e ecoa nesta mascarada, sob as suas realezas de um dia e os seus ceptros de cartão; o ouro rola, o vinho jorra, a devastidão fria ergue o vestido e bamboleia-se... horror! horror!
E depois, há sobre tudo isso um véu de que cada um tira a sua parte, para se esconder o mais possível.
Escárnio! horror! horror!

Gustave Flaubert, in 'Memória de um Louco'

четвртак, децембар 15

понедељак, децембар 12

A vida entra sem pedir licença.
Você não pode lutar.
Infiltra-se tão no íntimo que nos rouba até os desejos mais subterrâneos. Estas relações tão habituais quanto inusitadas, irradiam-se, palpitantes. você entenderá um dia? Possibilidade de tudo, impossibilidade de tudo.

- sua condição é a de ser enterrado vivo.Morte assim que sobrevive.

Vc se preocupa porque sabe que não é capaz de ser realmente inexistência, não pode permanecer irreal, um nada sem lembranças. Você inveja a mim, ou ao que pensa eu sê-lo.

-Sua claridade é insuperável."sans destin, pareils au nourrisson, qui dort, respirent Ceux du ciel".

Resolvemos dizer a você, porque concluimos que não há mais nada a dizer.Chegamos ao final do livro. Tardiamente. Assim como o vício sempre se sobrepõe a virtude, e o comunismo é o momento mais estúpido do espírito culto. Todos, todavia, inevitáveis. Daí a característica inequívoca alívio perturbador indigente e pleno, que está em mim e em ti. A imensa amargura é sabê-la inefável.
A verdadeira arte de viajar


A gente sempre deve sair à rua como quem foge de casa,
Como se estivessem abertos diante de nós todos os caminhos do mundo.Não importa que os compromissos, as obrigações, estejam ali...
Chegamos de muito longe, de alma aberta e o coração cantando!


(Quintana in “A cor do invisível”)

среда, децембар 7

(a los ojos de un cantante desesperado)

... alguma coisa a gente tem que amar
mas, o quê, eu não sei mais!

(hermano)

субота, децембар 3

A vida se resume:
Los trabajos y las noches
Ainda que me falte trilhar todos os caminhos
já me acostumei a este funesto silêncio
a percepção mutilada
a palavra petrificada
a ausência de uma greta no muro
esta obesa melâncolia que pesa e enverga meu corpo
sólo un dibujo
Artefato deformado, inútil.
Onde estou? perdida no desentendimento dessa urgência delicada, mas incompreensível.
soy pájaro, jaula, mano asesina niña muerta, amazona, juglar , princesa, en tanto, pequeña náufraga, la que murió de su vestido azul.
Este tédio.
Ele se matou quando, por fim, deu-se conta de que a realidade é incomunicável, e atroz.

уторак, новембар 29

A incerteza é um lugar onde, distraída, a angústia esquece o nome das coisas.
As fechaduras dançam com suas chaves valsas sem-fim.
Nas noites, nos bares, todos e suas máscaras.
Pra que por verdade em tudo isso?
Eu te esbarro, vc me apunha-la. Eu desapareço, vc me persegue. Quem caça?
Pra quem isso é só graça? Ao fim, todos e suas máscaras.Uma dança de desejos solitários.
Minha gargalhada tem a dor de tudo que só pode, e nunca será. O que quero, quando toco, se afasta, e me leva até você.O que eu quero se alastra, mas só me aparece você.
Um sonho questionado é como um coração partido.

недеља, новембар 27

Longa estrada de mão dupla.
Eu, Circe irreal dos febris,
que sadicamente tateia tua pele com espinhos,
escondo as feridas e saio às ruas.
O céu me afaga.
Finjo
danço
corro
Por um leve momento,
esqueço a infidelidade das borboletas.

петак, новембар 25

четвртак, новембар 24

Bom dia tristeza
Que tarde tristeza
Você veio hoje me ver
Já estava ficando até meio triste
De estar tanto tempo longe de você
Se chegue tristeza
Se sente comigo
Aqui nesta mesa de bar
Beba do meu copo
Me dê o seu ombro
Que é para eu chorar
Chorar de tristeza
Tristeza de amar

(Adoniran Barbosa e Vinícius de Moraes)

уторак, новембар 22

"... em torno dele soprava o vazio em que um homem se encontra quando vai criar. Desolado, ele provocara a grande solidão. (...) E como um velho que não aprendeu a ler ele mediu a distância que o separava da palavra."

Clarice Lispector, A Maçã no Escuro

субота, новембар 19

петак, новембар 18

A poesia noturna. Ser sem pele, sem dor, sem ser. A tristeza é uma maneira da gente se salvar depois?
Inquieto-me, fugídio, chovo.
Algo quer saltar, transborda-me rasgando.Sangra.
Mas tomo uma cerveja e fica tudo bem.
Tenho uns desafios, alguns amigos, livros queridos, uns sons, dores fundamentais, princípios fluídos, e uma fome insaciável.

Sou bonita que dá pro gasto.
No momento, tenho até um louco particular.
Não sei francês.

Não tenho paciência. Nem eu.
Queria dormir. Então fica calada, logo, logo, o sono vêm. Apague todas as luzes e espere. Mas todos os dias são iguais.Eh, caminha o mundo para uma enorme uniformização, mas dorme. Os franceses aprenderam a ver a diferença na miséria.
Nós também.

среда, новембар 16

(Pelo sambinha de ontem, e por tudo que acontece...)

Esquece o nosso amor, vê se esquece.
Porque tudo no mundo acontece
E acontece que eu já não sei mais amar.
Vai chorar, vai sofrer, e você não merece,
Mas isso acontece.
Acontece que o meu coração ficou frio
E o nosso ninho de amor está vazio.
Se eu ainda pudesse fingir que te amo,
Ah, se eu pudesse
Mas não quero, não devo fazê-lo,
Isso não acontece.

Cartola

понедељак, новембар 14

недеља, новембар 13

Multiplicidade ou formalização?
Nasce um domingo variadíssimo nos seus lances do mesmo. Ainda assim, planejo, descrente é verdade, desenterrar um conflito ou um desafio instigante que me distraia ou me apazigue. Sussurro a ti, mas não espalhe: desconfio que a paz está no caos, na insuficiência, naquilo que quase-é, e se esvai assim mesmo, deixando (apenas?) um indecidível desejo.
Esta inevitável precipitação me consola porque me angustia.
Onde esqueci minha razão?
Perco-me em estratégias e táticas inutéis para escapar da truculenta cilada que a sociedade burguesa nos prepara. Armo-me de uma alegria afiada, altas doses de ironia e sarcasmo e recrio deliberamente incertezas para que nada se perca nesse mundo fosco do cotidiano urbano.
E se este pretenso desajuste não é o bastante, em todo caso me separa e me afasta dos desbotados cheio de escrúpulos.

петак, новембар 11

Princípio da Incerteza


- René Magritte, 1944

уторак, новембар 8

Tem chovido demais.
Nunca sei escrever sem copiar de alguém. Também não sei não escrever. E menos sentir o que escrevo.Não que não sinta. Só não sou boa nisto, eu acho. Nunca sei se sinto o que sinto, ou se me distraio com o reflexo interno do quadrado de espelhos que olho de fora. Às vezes alguem abre a porta, ou me oferece a janela. Quem sabe alguém ainda parte meu coração? Eu sei, ainda não decidi se tenho um coração, mas se eu tiver ele é seu.
Brinco de ser ética como quem brinca de deus, ou compra um par de sapatos. Eu, os vagalumes, os navios e os submarinos não dormimos. Anda fazendo calor demais. Porque tanto a fazer?
Volta a chuva e ainda tem sol.É só porque os dias tem longuíssima duração no horário de verão( Braudel ia adorar...).
E eu nessa varanda que é a coisa mais minha dos últimos tempos.

недеља, новембар 6

Estou muito compenetrada no meu pânico.
Lá de dentro tomando medidas preventivas.
Minha filha, lê isso aqui quando você tiver perdido as esperanças como hoje. Você é meu único tesouro. Você morde e grita e não me deixa em paz, mas você é meu único tesouro.
Então escuta só; toma esse xarope, deita no meu colo, e descansa aqui; dorme que eu cuido de você e não me assusto; dorme, dorme. Eu sou grande, fico acordada até mais tarde.

Nada lá fora e minha cabeça fala sozinha, assim, com movimento pendular de aparecer e desaparecer. Guarde bem este quarto parado com máquinas de distrair, cabeça e pêndulo batendo. Guarde bem para mais tarde. Fica contando ponto.

субота, новембар 5

Quando meu amor se esvaiu
Não houveram muitas palavras
Não aconteceram ofensas
Nem desafetos
ou desamor
Foi impessoal
Sem choro
Nem lamurias
Sem arrependimentos pelo tempo de tentativas
(tanto tempo)
Não houve alivio
Nem felicidade
Não houve nada
Tudo parece continuo
Do nada ao nada

Sem ilusões de comunhão
Amanhã pensarei em esperanças

среда, новембар 2

понедељак, октобар 31

Acaricia minha nuca, e deixa a noite chegar. É bom nunca voltar pra casa, é bom nunca ter onde ir. Eu vivo? Eu só quero. Os confins do mundo são meus, e por isso fico aqui, inerte, esperando como vírus incubado, que alguma coisa me surpreenda. Poesia é coisa muita profunda, ressoa muita longa. Corta, rasga, desmancha, desconfigura. A poesia é um Universal que se odeia. Há quem se perde no emaranhado do próprio cotidiano. Não vou mais poder tocar, já não vejo. Já não sei mais nem se existe. Tenho que ir, não posso esperar. É preciso saber desatar os nós. Sou tão gutural... apenas.
O discernimento me traz todas as dores do mundo.
Então, embriago-me.
Vem?

субота, октобар 29

(Para Luciano Mattar...)


среда, октобар 26

Respeito muito minhas lágrimas, mas muito mais minha risada. Porque quando eu amo, eu odeio, eu adoro. E Diante disso, resta dançar um tango argentino.
O menino dorme des-sossegado: o mundo é grande!
Ele não perde por esperar.
Distribuirei entorpecentes ou semearei cartas suicidas?

Meus cansaços são ateus dos deuses da minha escolha...
Eu, também sou um homem traduzido, transportado, traído, traidor.Traduttore, traditore:
ambivalência, anfibolia, anfibologia, asteísmo, double entendre e equívoco.
Sous les espèces d'or d'un sein reconnaissant!

недеља, октобар 23

A Fábrica do Poema


SONHO O POEMA DE ARQUITETURA IDEAL
CUJA PRÓPRIA NATA DE CIMENTO
ENCAIXA PALAVRA POR PALAVRA, TORNEI-ME PERITO EM EXTRAIR
FAÍSCAS DAS BRITAS E LEITE DAS PEDRAS.
ACORDO;
E O POEMA TODO SE ESFARRAPA, FIAPO POR FIAPO.
ACORDO;
O PRÉDIO, PEDRA E CAL, ESVOAÇA
COMO UM LEVE PAPEL SOLTO À MERCÊ DO VENTO E EVOLA-SE,
CINZA DE UM CORPO ESVAÍDO DE QUALQUER SENTIDO
ACORDO, E O POEMA-MIRAGEM SE DESFAZ
DESCONSTRUÍDO COMO SE NUNCA HOUVERA SIDO.
ACORDO! OS OLHOS CHUMBADOS PELO MINGAU DAS ALMAS
E OS OUVIDOS MOUCOS,
ASSIM É QUE SAIO DOS SUCESSIVOS SONOS:
VÃO-SE OS ANÉIS DE FUMO DE ÓPIO
E FICAM-ME OS DEDOS ESTARRECIDOS.
METONÍMIAS, ALITERAÇÕES, METÁFORAS, OXÍMOROS
SUMIDOS NO SORVEDOURO.
NÃO DEVE ADIANTAR GRANDE COISA PERMANECER À ESPREITA
NO TOPO FANTASMA DA TORRE DE VIGIA
NEM A SIMULAÇÃO DE SE AFUNDAR NO SONO.
NEM DORMIR DEVERAS.
POIS A QUESTÃO-CHAVE É:
SOB QUE MÁSCARA RETORNARÁ O RECALCADO?

>> Adriana Calcanhoto

петак, октобар 21

четвртак, октобар 20

O filósofo Ludwig Wittgenstein (que comparece intraduzido em om / e. e. wittgenstein) dedicou toda sua obra à reflexão sobre os limites da linguagem. É famosa a asserção com que ele encerra o seu Tratactus Logico-Philosophicus: “O que não se pode falar, deve-se calar”.
No extremo mais extremo dessa (im)possibilidade, para onde a filosofia ou a fala de todo dia apenas apontam, sem alcançar, emerge a linguagem-coisa de Augusto de Campos.
Entre falar e calar, seus poemas parecem dizer o indizível, por não tentar dizê-lo, mas realizá-lo através da linguagem.
Dessa condição limítrofe surgem as marcas de negação que vêm caracterizando sua poesia há muitos anos — poetamenos, expoemas, despoesia, o afazer de afasia, o vácuo o vazio o branco, o oco, a canção sem voz, poesia sem placebo, semsaída, nãopoemas, não.
Tais sinais de menos adquirem positividade na medida em que os poemas se efetivam; minérios extraídos de recusas a todos os excessos e facilidades.
O que sobra depois de subtrair tanto? Que sumo essência medula “osso/sos”? Augusto não responde, mostra. Como em não, que dá título a este volume, poema feito do dizer o que não é poesia, numa sequência de pequenos quadrados brancos nas páginas negras, que vão pouco a pouco rarefazendo as colunas verticais do texto até o limite vertebral da única linha “oesia”.

Arnaldo Antunes
"Não", by Augusto de Campos, ed. Perspectiva: 24/10/2003
ORAÇÃO DOS ESTRESSADOS
Luís Fernando Veríssimo


Senhor, dê-me serenidade para aceitar as coisas que não posso mudar, coragem para mudar as coisas que não posso aceitar e sabedoria para esconder os corpos aquelas pessoas que eu tiver que matar por estarem me enchendo muito o saco.

Também, me ajude a ser cuidadoso com os calos em que piso hoje, pois eles podem estar diretamente conectados aos sacos que terei que puxar amanhã.

Ajude-me sempre, a dar 100% de mim no meu trabalho:

12% na segunda-feira,
23%, na terça-feira,
40% na quarta-feira,
20% na quinta-feira,
5% na sexta-feira.

E, ajude-me sempre a lembrar, quando estiver tendo um dia realmente ruim e todos parecerem estar me enlouquecendo, que são necessários 42 músculos para socar alguém, 17 para sorrir e apenas 4 para estender meu dedo médio e mandá-lo para "aquele lugar"...

понедељак, октобар 17

Nosferatu: Nós / Torquato



putresco

putresco

putresco

torquato: teus últimos dias de paupéria me

vermicegos enrolam a substância da treva
vampiros cefalâmpados
(disse)

mas agora put
resco
put
(horresco
referens)
resco
sco
sc
o



Haroldo de Campos

недеља, октобар 16

петак, октобар 14

O SILÊNCIO DA SEREIAS

Prova de que até meios insuficientes - infantis mesmo, podem servir à salvação:

Para se defender da sereias, Ulisses tapou o ouvidos com cera e se fez amarrar ao mastro. Naturalmente - e desde sempre - todos os viajantes poderiam ter feito coisa semelhante, exceto aqueles a quem as sereias já atraíam à distância; mas era sabido no mundo inteiro que isso não podia ajudar em nada. O canto das sereias penetrava tudo e a paixão dos seduzidos teria rebentado mais que cadeias e mastro. Ulisses porém não pensou nisso, embora talvez tivesse ouvido coisas a esse respeito. Confiou plenamente no punhado de cera e no molho de correntes e, com alegria inocente, foi ao encontro das sereias levando seus pequenos recursos.

As sereias entretanto têm uma arma ainda mais terrível que o canto: o seu silêncio. Apesar de não ter acontecido isso, é imaginável que alguém tenha escapado ao seu canto; mas do seu silêncio certamente não. Contra o sentimento de ter vencido com as próprias forças e contra a altivez daí resultante - que tudo arrasta consigo - não há na terra o que resista.

E de fato, quando Ulisses chegou, as poderosas cantoras não cantaram, seja porque julgavam que só o silêncio poderia conseguir alguma coisa desse adversário, seja porque o ar de felicidade no rosto de Ulisses - que não pensava em outra coisa a não ser em cera e correntes - as fez esquecer de todo e qualquer canto.

Ulisses no entanto - se é que se pode exprimir assim - não ouviu o seu silêncio, acreditou que elas cantavam e que só ele estava protegido contra o perigo de escutá-las. Por um instante, viu os movimentos dos pescoços, a respiração funda, os olhos cheios de lágrimas, as bocas semi-abertas, mas achou que tudo isso estava relacionado com as árias que soavam inaudíveis em torno dele. Logo, porém, tudo deslizou do seu olhar dirigido para a distância, as sereias literalmente desapareceram diante da sua determinação, e quando ele estava no ponto mais próximo delas, já não as levava em conta.

Mas elas - mais belas do que nunca - esticaram o corpo e se contorceram, deixaram o cabelo horripilante voar livre no vento e distenderam as garras sobre os rochedos. Já não queriam seduzir, desejavam apenas capturar, o mais longamente possível, o brilho do grande par de olhos de Ulisses.

Se as sereias tivessem consciência, teriam sido então aniquiladas. Mas permaneceram assim e só Ulisses escapou delas.

De resto, chegou até nós mais um apêndice. Diz-se que Ulisses era tão astucioso, uma raposa tão ladina, que mesmo a deusa do destino não conseguia devassar seu íntimo. Talvez ele tivesse realmente percebido - embora isso não possa ser captado pela razão humana - que as sereias haviam silenciado e se opôs a elas e aos deuses usando como escudo o jogo de aparências acima descrito.

Kafka/ Tradução de Modesto Carone

четвртак, октобар 13

Têm sido dias de estar à deriva, ao vento, ao léo.
Não sei bem o que isso significa. Às vezes há impressão de que tudo é um cansaço e uma falta de rumo. Peso-me, mas ao mesmo tempo, flutuo.
Nem estou tão cansada, nem me falta tanto rumo. E daí: não importa.
Mas, importa. Se não é o fundamental, é simplesmente o que existe.
Interpenetram-me tantas dores, tantas... E resulto assim, moído de eu viver, querendo fugir, mas extática ainda.Como um turbilhão quieto. Segundo congelado antes do caos.

понедељак, октобар 10

петак, октобар 7

Ando me divertindo horrores.
Nem sei bem porque.
Mas rio a toa.
Não é da angústia à delícia, ou a delícia da angústia.
Me despedi da bipolaridade. será? de verdade, nem importa.(Borrowed for that purpose). Nem sabe, sabe-se, ninguém sabe. Mas, se é pra dar têmpero ao tempo, porque não brincar de já ter descoberto? Fusão completa mas momentânea. Explosiva, mas inaudível. Não te conto, nao te conto. Estou muito cansada das narrativas do mundo moderno. Ah, nem falo das evoluções biológicas, mas juro que foi bom lembrar que as placas tectônicas estão à deriva...estamos boando, por mais que me desmintam os ingênuos corações acostumados a esperar o reino dos ceús, seja ele vermelho ou não.
Então, ato de autonomia jocosa, permito a todos que des-cuidem dos prazeres e vicissitudes da vida.

Em pauta (questão de ordem):
"A lei malthus da sensibilidade: Os estímulos da sensibilidade aumentam em progressão geométrica; a própria sensibilidade em progressão aritmética"
discorda?

четвртак, октобар 6

As disputas medíocres, acadêmicas, quase ainda não me esforçam a palavra.
Meu desafio é cada vez mais solitário e diletante e intransigente; não mais perigoso que o juízo alheio, mas tão mais perigoso quanto mais se escora em mim. Eu sou o meu próprio perigo: inimigo de mim mesmo, indecidível.

уторак, октобар 4

Em mim tudo recomeça, nada , nunca, está feito. Eu me destruo na infinita possibilidade dos meus semelhantes:ela aniquila o sentido deste Eu. Se atinjo, por um instante, o extremo do possível, pouco depois eu fugiria, já estaria alhures, como um rebanho enxotado por um pastor infinito, a carneirada balindo que somos fugiria infinitamente do horror de uma redução do ser à totalidade.
O essencial é o extremo do possível, onde o próprio deus não sabe mais, desespera e mata.

Bataille

понедељак, октобар 3

A SCHOPENHAUER

Um passo atrás
no escuro:
o mundo não me quer
sem muros.

Logo
não quero
nada do mundo.

A massa
do muro
me fortalece.

Amassa
a dor
dos murros.

Que prazer
libertário
não esperar
não querer
não precisar
não temer
não me angustiar...

O resto é nada.

Embainho a espada.

Respiro.

Basta.

F. Rocha

субота, октобар 1

Ando muito eufórica pra pensar, pra escrever, pra sentir. Rio divinamente, detesto o mobral, todos os homens e macacos, e acho a evolução o fim da picada.
Outorgo todos os poderes a mim mesma.
E vou desbravar os rincões do universo cintilante.
E viva!

среда, септембар 28

Recordemos a fábula. Compelidos pela sede, o lobo e o cordeiro se dirigiram ao rio. O lobo encontrava-se na parte superior. Muito abaixo dele bebia o cordeiro. O ladrão, incitado por fome insaciável, começou a querelar, perguntando porque o cordeiro lhe turvara a água. O lanígero observou assustado que a alegação da fera era infundada em virtude da posição de ambos. Repelido pela verdade, o lobo acrescentou que o cordeiro tinha falado mal dele seis meses atrás. O cordeiro respondeu que isso ele não poderia ter feito porque ainda não tinha seis meses. Vencido pela segunda vez, o lobo argumentou que o pai do cordeiro o insultara e dilacerou o indefeso.


lupus stabat super

понедељак, септембар 26

Os ausentes



(Ao Frei Tito)




Os ausentes necessitam sempre
bilhetes, cartas e coisas
vezes pequenas lembranças
uma gravata, um poema, um postal.


Os ausentes são tão necessitados
que ninguém os lembra
nem só por saudade ou falta.


Os ausentes têm mãos invisíveis
e figura tão diáfana
que os versos para eles
já nascem feitos poemas.


Os ausentes por qualquer acaso
jamais fogem ao nosso convívio
ainda que a distância seja tanta.


Dos ausentes fica sempre um sorriso
como as pinturas recheias
de surpresa, reencontro e irreal.

Roberto Pontes

субота, септембар 24

Escorreguei pela cidade com uma languidez peculiar. As espirais do meu cabelo me distraem, mas trazem perguntas muito difícies. Desvio de todas e me concentro nas ovelhinhas enfêrmas. Eu também estou um pouco doente, cada dia mais dores e dores dores. Tento desenterrar forças para resolver uma nova configuração para o velho conflito entre necessidade e vontade. Dionisos ou pulsão de morte, ainda não me resolvi, andam mais fortes que nunca, e flamejam-me. A labareda é inacreditável, não cabe nas margens desse diário terapêutico. Faz calor demais: café gelado. Os arquivos são inconsciente coletivo que sustenta o poder. Penetro-o. Mas já não tenho paciência, e os facinorosos desaparecem pelo sertão. Acometida bruscamente pelo desejo de tomar sorvete, tomar cerveja. Mas devo continuar ainda, mais um onibus. Dessa vez adentro por ruas muito estreita. Aplaudo os pormenores. Hesito. Clas class.desembarco novamente na praça 7. Soprava um vento pesado.Naquela hora a cidade me pareceu bela.Disse em silêncio a todas as pessoas para tomar cuidado comigo.Era mesmo possível que pudesse exercer má influência. Entretive-me consumindo-me. Longas horas...

петак, септембар 23

Eu também, não resisto. dans mon île, vendo a barca e as gaivotinhas passarem. sua resposta vem da barca e passa por aqui, muito rara.
Quando tenho insônia me lembro sempre de uma gaffe e de um anúncio do museu: " To see all these works together is an experience not to be missed." E eu nem nada. Fiz miséria nos caminhos do conhecer. mas hoje estou doente de tanta estupidez porque espero ardentemente que alguma coisa...divina aconteça. f for fake. os horóscopos também erram.
Me escreve mais, manda um postal do azul (eu não me espanto).
O lugar do passado? Na próxima te digo quem são os 3, mas os outros grandes...eu resisto.
Não fica aborrecida: beijo político lábios de cada amor que tenho.

Ana cristina Cesar

четвртак, септембар 22

Marcelo:
(de vc/ pra vc)

" Marco Polo descreve uma ponte, pedra por pedra.
- Mas qual é a pedra que sustenta a ponte? - pergunta Kublai Khan
- A ponte não é sustentada por esta ou aquela pedra - responde Marco-, mas pela curva do arco que estas formam.
Kublai Khan permanece em silêncio, refletindo. Depois acrescenta:
- Por que falar das pedras? Só o arco me interessa.
Polo responde:
- Sem pedras, o arco não existe."
( Calvino, As Cidades Invisíveis)


Entre a pedra e o arco, O QUE EXISTE É A PONTE.

понедељак, септембар 19

Se extravaso-me em dias banais é porque sempre falta alguma coisa: um copo, um beijo, uma carta, um riso, um corte, um insulto, um lençol, um desfile, um coração, um jardim.
Troquei todos os acasos por orgias intelectuais.
Sentir a vida não é mais do que forjar todas as possibilidades.
Arrebente-se três vezes ao dia.
Venda-se duas vezes por semana.
Afague um leproso por mês.
Ganhe na loteria uma vez na vida:
Lei da compensação universal.
E se o ainda sinto o bafo da angústia. O que importa não é o bafo da angústia, mas o que sinto ainda. O resto se reveza depressa demais para que eu me preocupe com algo além de sorvê-lo com apetite.
Inquietação prolixa.

субота, септембар 17

Sobre o termo Distracção. Há muito que fazia considerações deste género a propósito do termo «distracção»: usa-se para exprimir prazeres, entretimentos. O termo vem de distrahere: desligar de, arrancar a. O vulgo, quando diz que se distrai, não sabe que utiliza uma expressão de sentido negativo, que traduz a primeira operação a fazer para obter um prazer qualqer: extirpar-se do estádio de tédio ou de sofrimento em que nos encontramos. Assim, «vou-me» distrair quer dizer: vou tirar do meu cérebro a ideia do mal presente, vou esquecer, se puder, a minha dor de maneira a, ainda por cima, ir gozar. Todos os homens precisam de se distrair e gostariam de se sentir assim continuamente.
(...) Será portanto impossível, sem recorrermos a estes passatempos mais ou menos frívolos, vivermos na nossa própria companhia - sem nos apoiarmos no convívio de outra pessoa, de um nosso semelhante com um tédio igual ao nosso, ou nos espectáculos que oferecem ao nosso espírito as invenções de outros homens, iguais a nós e que na criação dessas obras, que agora amenizam os nossos dias, também procuraram um remédio para a dificuldade de conviverem consigo próprios?

Eugène Delacroix, in 'Diário

петак, септембар 16

Ressaca




Venham todas as vozes, todos os ruídos e todos os gritos

venham os silêncios compadecidos e também os silêncios satisfeitos;

venham todas as coisas que não consigo ver na superfície da sociedade dos homens;

venham todas as areias, lodos, fragmentos de rocha

que a sonda recolhe nos oceanos navegáveis;

venham os sermões daqueles que não têm medo do destino das suas palavras

venha a resposta captada por aqueles que dispõem de aparelhos detetores apropriados;

volte tudo ao ponto de partida,

e venham as odes dos poetas,

casem-se os poetas com a respiração do mundo;

venham todos de braço dado na ronda dos pecadores,

que as criaturas se façam criadores

venha tudo o que sinto que é verdade

além do círculo embaciado da vidraça...

Eu estarei de mãos postas, à espera do tesouro que me vem na onda do mar...

A minha principal certeza é o chão em que se amachucam os meus joelhos doloridos,

mas todos os que vierem me encontrarão agitando a minha lanterna de todas as cores

na linha de todas as batalhas.

Osvaldo Alcântara

недеља, септембар 11

O estado primordial do mundo é o Caos. Segundo os poetas, matéria que existia desde tempos imemoriais, sob uma forma vaga, indefinível, indescritível, na qual se confundiam os princípios de todos os seres particulares. Caos era ao mesmo tempo uma divindade, por assim dizer, rudimentar, capaz, porém, de fecundar. Gerou primeiro a Noite, e depois Eros.
Manto volante, a noite envolve com as dores e as delícias do mesmo não idêntico.
Observo atentamente a roda da fortuna girar.
Sempre haverá tempo para os acertos de conta.
Esta cidade é a extraordinária morte de um astro.Ao abrir os olhos, cerco-me de horror, não pelo que vejo, mas pela ausência do fundamental: angústia.
Todos os que, sendo bonitos e perfeitos demais, se tornam os mais horrorosos seres fantasiados e despreendidos da dor de ser o que se é.
A frivolidade dispensa a angústia, mas cobra caro seu feito.
É vão e grosseiro fugir da dor atrás das máscaras. Os disfarces cotidianos são gritos da angústia, não seu silêncio e morte.
Esta estranha retórica que me persegue me alivia mas me foga porque não é o bastante. Ignorar a lógica não é o bastante.
Armas equivocadas produzem discórdia, mas não discordância.

петак, септембар 9

Resssaca estrupidante.
Tudo muito muito lento.
Essa letargia é como uma visita a lugares muito especiais.
Aforismos sobre a difícil arte de estar vivo e ter que lidar com isso de alguma forma.
Liberto-me do cárcere, mas olho o mundo com os olhos de um prisioneiro.
Meus orgãos, rebeldes, esquecem-se de sua verdadeira virtualidade.
Muitas dores.
Desidratação moral;
Sobretudo cansaço: são muitos dias de trabalhos intensos.
ressaca estrupidante
se você não pode vencê-la, junte-se a ela.



- uma cerveja façavor.

четвртак, септембар 8

" Minha ética pessoal é um tratado de estilo, não de moral"
Roland Barthes

уторак, септембар 6

Questionamento de tudo. Pode tomar diversas formas .Ligado ao gênio poético:forma mais separada da multidão. Oposição entre a volta da Idade do Ouro e o gênio Poético: Hegel e o serviço militar. O gênio poético do lado do extremo. Mas que se torna o gênio poético na solidão? ( De modo geral- para a introdução- , a partir do momento em que não se parte mais da pressuposição dogmática, parte-se da poesia.) A solidão do gênio necessário ao sacrifício em que tudo é vítima. Caráter desconhecido (mal conhecido) do sacrifício. E a aventura do espírito que foi a fundo das coisas, desceu ao inferno.
Necessidade de tornar-se tudo - possibilidade disto que tem o gênio na solidão, mas proximidade da loucura. Nietzsche crucifica Dionisos Ecce homo: megalomania.
Não se pode de maneira alguma esperar um resultdo análogo ao do sacrifício dos reis. A eficacidade só tem efeito na região desconhecida. Finalmente, o gênio poético apaga-se sem que a multidão preceba algo . Alguns somente.
Mas tudo se dissolve. Mais nada a opor ao mundo militar. Mais nada. Toda a febre do espírito se destruindo no silêncio do súplicio, do êxtase. Virilidade e transparência totais.

Georges Bataille
Hoje vi Sandy e Junior no MG TV, a apresentadora os apresentou como roqueiros e ambos me pareceram bastante simpáticos. Disseram que tudo mudou desde quando cantavam “maria chiquinha”, e tinham um metro e meio. Sandy está namorando, Junior não gosta de falar no assunto. De concreto vi que Junior estava com uma blusa vermelha escrita em letras garrafais “CCCP”, o que quer dizer em russo União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Gabriela, a apresentadora do jornal, perguntou o que queria dizer CCCP a Junior, que com ajuda de assessores disse meio com displicência, meio com algo que não defini claramente que era União das Repúblicas alguma coisa soviética. A blusa era da Adidas e parecia mais com uma blusa de futebol. Sandy estava meio gordinha e ainda sem peito. E tudo no mundo ainda se transforma timidamente...

субота, септембар 3

Era hora de sair só. Encostar a cabeça na janela do taxi e mandar apenas seguir, aproveitando os ultimos momentos da falta absoluta de destino. Depois, vira aqui e ali, para e paga. Ando um pouco a pé. Percorro meia duzia de bares tendo idéias perversas. A perversidade me vem assim, como mensagens de oráculo, dessas que só são decifradas quando já é tarde demais. Destilados. OS fermentados sempre me pareceram sociáveis em essência para se degustar só. Aquele amargo transparente da vodka cabe muito melhor ao que vivo agora. A delícia e a dor de estar só, à deriva. A presença intermitente de cantadas baratas é um privilégio e uma desvantagem dos meus 23 anos. Acho que envelhecer me dará a chance de poder andar um dia sem que ninguém me note. Por enquanto, carrego olhares, às vezes como fardo,às vezes como troféu.

петак, септембар 2

Dizem, um deslocamento permite que a gente ouça nas palavras dos outros aquilo que é só a gente.
Então,
Clarice:
"Não é que vivo em eterna mutação, com novas adaptações a meu renovado viver e nunca chego ao fim de cada um dos modos de existir. Vivo de esboços não acabados e vacilantes. Mas equilibro-me como posso."

среда, август 31

уторак, август 30

Intrépida busca: ousa tudo, sem necessidade de nada. Uma embriaguês contínua, mas disritmada: cortesia e bestialidade, arte e ignorância, solidão e sociedade.
Apenas um pressentimento:
Narciso se afogou no amor.
Viver o exercício apaixonado de uma busca:A vida está no mínimo e no imenso.
Ainda que nem eu perceba, estou em ti: corpo e Homem indiscerníveis. Choque brutal, esquivo inevitável, inverossímel.
Irreal.
Nós não somos um mundo de realidades.
Somos apenas espaço.
Que jamais é, ainda-não.
Não se pode desistir do nada.

недеља, август 28

Não: devagar.
Devagar, porque não sei
Onde quero ir.
Há entre mim e os meus passos
Uma divergência instintiva.
Há entre quem sou e estou
Uma diferença de verbo
Que corresponde à realidade.

Devagar...
Sim, devagar...
Quero pensar no que quer dizer
Este devagar...
Talvez o mundo exterior tenha pressa demais.
Talvez a alma vulgar queira chegar mais cedo.
Talvez a impressão dos momentos seja muito próxima...

Talvez isso tudo...
Mas o que me preocupa é esta palavra devagar...
O que é que tem que ser devagar?
Se calhar é o universo...
A verdade manda Deus que se diga.
Mas ouviu alguém isso a Deus?

Álvaro de Campos

четвртак, август 25

Todos me acham. Sou obvia?
me escapam.
Sou Difícil?
me conhecem. Sou detestável?
Então fica assim. Não durmo faz quatro dias. O dia todo rumo por lugares que deveria conhecer muito bem, mas não me reconheço. A cada cinquenta minutos um café amargo me faz companhia.Por favor, alucinações alheias mais um pão de queijo. Quando desce. No mais, sonho sempre, discuto invariavelmente, e me indigno com tudo.Penso em discursos anônimos.Lembro de deslocamentos irrevogáveis. Esqueço.Saio para beber. Chego até aquele ponto onde a gente fica intermitente entre o pensar e o sentir, ponto no qual costumam-se decidir as mais importantes coisas. tenho sono? não, ainda não é a hora. vou ler, pensar no descompasso entre meu corpo e o resto. Pensar nas dores, nos cigarros e no que sobra.Em todos os ditos, e nos não ditos também.
Um dia, a cama. deito e então, com um senhor grisalho topetudo, objeto das obsessões recentes, derrido-me.

среда, август 24

Plágio

Eu sou triste
Triste
Porque vocês são feios e burros,
e não morrem nunca.

уторак, август 23

Trabalho agora ranhuras estéticas,
aproveito o dia em sua agudez.
Olho por todos os desvãos. Apareço.
Arremate de tecido de angústia é missão incessante.
misturo todas as setas, e vou ganhar a vida.

Tessitura em labaredas. Pulo muros esquecidos.
tudo psicanálise.
temperos e intempéries.
eu sei, de nada adiantarão estratégias e ausências,
(você não pode mesmo ficar).
Fagocitei-me sem sangrar.

Tem coisa que não nasceu pra ser carcomida.

понедељак, август 22

Site q me acompanhou nessa longa e tão somente mais uma noite insone
http://paginas.terra.com.br/arte/PopBox/sonetario/nsonetario.htm
muito bom!

недеља, август 21

SONETO DA LOUCURA

A minha casa pobre é rica de quimera
e se vou sem destino a trovejar espantos,
meu nome há de romper as mais nevoentas eras
tal qual Pentapolim, o rei dos Garamantas.

Rola em minha cabeça o tropel de batalhas
jamais vistas no chão ou no mar ou no inferno.
Se da escura cozinha escapa o cheiro de alho,
o que nele recolho é o olor da glória eterna.

Donzelas a salvar, há milhares na Terra
e eu parto e meu rocim, corisco, espada, grito,
o torto endireitando, herói de seda e ferro,

e não durmo, abrasado, e janto apenas nuvens,
na férvida obsessão de que enfim a bendita
Idade de Ouro e Sol baixe lá das alturas.

CDA

субота, август 20

Há uma indefinição e uma indiferença.
Alguns cortes, banais.
no fundo, no chão, muitos cacos.
Há muita coisa espalhada,
palhaçadas, aporias e algumas conspirações.
Não há, portanto, nada mais a acontecer.
O caso se encerra antes de ser, esgotoados nos simulacros que cria de si mesmo.
Não há nada a fazer, nem mesmo o nada.
o movimento persiste, por uma rebeldia, mas já não vai levar a nada, e apenas produz uma sensação de fora-de-lugar.
Não é preciso ter pressa, não é preciso ter intenção. Não faz diferença esperar ou não.
Não há o que lamentar, ainda esfacelados eles reluzem algo, talvez seja belo.
Se não há limites não há escolha. No espelho que se destroça, nada se perde que não seja o mesmo.

четвртак, август 18

Todo o resto...
A vastidão que me confundi deixa-me enciumada.Porque o riso escancarado não inibe, a chantagem não desarma,o argumento não convence, a arma não derruba. E tudo isso que permanece me irrita-seduz, desavisado demais para entender que gasto o sono que não tenho e deixo meus pensamentos pastarem, a deriva, por todos lugares onde está, e eu não. O resto, o que me excede, é insistente, e intratável, temível como um exercíto a postos, deslumbrante encantamento daquilo que ultrapassa as possibilidades do que é.

уторак, август 16

O Acaso

Cai
a pluma
rítmico suspense do sinistro
nas espumas primordiais
dde onde há pouco sobressaltara seu delírio a um cimo fenescido
pela neutralidade idêntica do abismo



Fosse

Seria
pior
não
mais nem menos
indiferentemente mas tanto quanto

Mallarmé

недеља, август 14

Eu queria muito poder compartilhar com você este rasgo. Se fosse possível, gostaria que entendesse porque fujo, porque corro, porque simplesmente vou embora e acho melhor não olhar pra trás. Eu queria dizer o que me amedronta, desdobrar o que me perturba, traduzir o que me fascina. Se eu pudesse desfazer todos os nós, cancelar todos os contratos, fuzilar todos os caretas, fazer chorar os sorrisos falsos, inventar todas as verdades e amar sem ódio todas as coisas... Mas não. Sou assim, incompleto, enraivecido, entortado, inquieto e confuso.Eu sei o que quero mas não sei dar a isso concretude. A minha plenitude é uma bolha que se desmancha no ar.
Se eu pudesse sair da minha cabeça, eu conseguiria saber se existe alguma coisa fora dela. Se fosse possível eu sair detrás das paredes do meu corpo, eu conseguiria encarar o mundo de frente.
Do jeito que está, tenho que atuar nele desta forma canhestra e a longo prazo.

петак, август 12

" Pra mim, Ser é admirar-me de estar sendo"

Fernando Pessoa

среда, август 10

Devaneio de máscaras.
Esvoam-se.
Tudo tão leve, eufórico, belo, magistral.
Meu corpo embala-se, e desliza pelas pessoas, coisas e cores. Desvanecem todas elas no mais belo espetáculo exclusivo para mim.
Apenas pairo. Olho em volta, nada faz sentido, tudo tão aconchegante.
Tenho muita vontade de chorar.

уторак, август 9

Se vc me quiser vai ser com o cabelo trançado
resposta na ponta da lingua
teste de HIV na mão
Se me quiser desligue a televisão
Leia filosofia e decore o kama sutra. Muito bem!
Se me quiser esteja em casa
retorne as ligações e traga flores
Não me venha com teorias sobre ereção
ou centimetros a mais
Nem sempre vou querer sexo
nem sempre vou dizer tudo
Ou acender a luz.
Posso usar ternos ou aventais. qual a diferença?
As noites serão sempre mais intensas a luz de velas
Se você realmente me quiser, ouse digerir a contradição.
Me ajude a ser uma mulher diante de um homem.
Quem disse que seria fácil?

(Surrupiado de http://diariodosolhos.zip.net)

субота, август 6

A 'dissipação do espírito' manifesta-se, na tagarelice, na apetência indomável 'de sair da torre do espírito e derramar-se no variado', numa irrequietação interior, na inconstância da decisão e na volubilidade do caráter e, portanto, na insatisfação insaciável da curiositas.

A perversão da inclinação natural de conhecer em curiositas pode, conseqüentemente, ser algo mais do que uma confusão inofensiva à flor do ser humano. Pode ser o sinal de sua total esterilidade e desenraizamento. Pode significar que o homem perdeu a capacidade de habitar em si próprio; que ele, na fuga de si, avesso e entediado com a aridez de um interior queimado pelo desespero, procura, com angustioso egoísmo, em mil caminhos baldados, aquele bem que só a magnânima serenidade de um coração preparado para o sacrifício, portanto senhor de si, pode alcançar: a plenitude da existência, uma vida inteiramente vivida.
traço



s. m.,
acto ou efeito de traçar;

risco;

segmento de linha;

particularidade da linha do rosto;

feição;

fig.,
vestígio;

sinal, rasto;

carácter;

prov.,
pedaço de qualquer coisa cortada transversalmente;

Brasil,
porção de bebida tomada de uma só vez.
EM UMA ESTAÇÃO DO METRO

A aparição destas faces na multidão;
Pétalas em úmido ramo negro.

Ezra Pound

четвртак, август 4

Não. Nunca tive hora pra voltar.E tantas vezes vi o teto girar sobre mim.
Sempre soube que as garotas más podem ir a qualquer lugar. E eu nunca fui a lugar algum. Meu coração vagabundo quer guardar o mundo em si, mas sempre muda de assunto.E não, não há nehuma pretensão, apenas uma vontade de gritar.
Tudo gira.
E nada há de mais divertido.

среда, август 3

Rabelais não leu Mishima.

Kafka não leu Drummond.

Flaubert não leu Bukowski.

Sólon não leu Petrônio.

Heródoto não leu Huidobro.

Racine não leu Augusto dos Anjos.

Victor Hugo não leu Kerouac.

Safo não leu Camões.

Luciano não leu Rimbaud.

Baudelaire não leu Freud.

Apuleio não leu Lautreámont.

Homero não leu Bashô.

Pessoa não leu Rosa.

Machado de Assis não leu Adorno.

Pound não leu Torquato.

Parmênides não leu Dante.

Oswald não leu Leminski.

Shakespeare não leu Maiakóvski.

Ts´ao Ts´ao não leu Peirce.

Odorico Mendes não leu Haroldo.

Cruz e Souza não leu Burroughs.

Gregório de Mattos não leu Verlaine.



A vida é assim mesmo.

Bruno Brum
Comunhão

Todos os meus mortos estavam de pé, em círculo eu no centro.
Nenhum tinha rosto.
Eram reconhecíveis pela expressão corporal e pelo que diziam no silêncio de suas roupas além da moda e de tecidos;
roupas não anunciadas nem vendidas.
Nenhum tinha rosto.
O que diziam escusava resposta, ficava, parado, suspenso no salão, objeto denso, tranqüilo.
Notei um lugar vazio na roda.
Lentamente fui ocupá-lo.
Surgiram todos os rostos, iluminados.

CDA

уторак, август 2

"Escrevo por ter nada a fazer no mundo: sobrei e não há lugar para mim na terra dos homens"
Clarice Lispector

четвртак, јул 28

Sujeito à ataques melindrosos.
Haha, surtos de melindre emocional...
haverá por perto alguém para explodir, não sei, pouco provável.
Impaciência e irritabilidade, chateações e mágoas... evita-las seria morrer. Pois na vida não há nada que, de uma forma ou outra, não leve a essas graciosas emoções.
Ângulos desarmônicos e pequenas atrocidades vistas pela tv.
É tudo, e basta.

среда, јул 27

Não quero mais a fúria da verdade. Entro na sapataria popular. Chove por detrás. Gatos amarelos circulando no fundo. Abomino Baudelaire querido, mas procuro na vitrina um modelo brutal. Fica boazinha, dor; sábia como deve ser , não tão generosa, não. recebe o afeto que se encerra no meu peito. Me calço decidida onde os gatos fazem que me amam, juvenis, reais. Antes eu era 36, gata borralheira, pé ante pé, pequeno polegar, pagar na caixa, receber na frente. Minha dor. Me dá a mão. Vem por aqui, longe deles. Escuta querida, escuta. A marcha desta noite. Se debruça sobre os anos neste pulso. Belo belo. Tenho tudo que fere. As alemãs marchando que nem homem. As cenas mais belas do romance o autor não soube comentar. Não me deixa agora, fera.
Ana Cristina Cesar

понедељак, јул 25

-você tem que estar preparado para queimar em sua própria chama.
Assim falou Zaratustra.

субота, јул 23

Tudo que pensava ser insegurança era curiosidade.
Aporia errática que envolve magia e poder.
Ando pensando em um dia talvez desintristecer...Afinal, porque não... talvez se houver, possa haver alvorada em outro canto.
Quando apareço desapareço ainda mais. Porque o resto é apenas diluir e adensar, pensar.
Tão somente há um problema insuperável, (o que atesta ser toda vontade de mudar um suspiro bobo da falta absurda do que fazer): o desespero dos livros, e as idéias sempre repetidas. Além, é claro, de todos os caretas que não gostam de brincar com suas máscaras.

петак, јул 22

Poesia
eu não te escrevo
eu te
vivo
e viva nós!

Cacaso

понедељак, јул 18

Eu vi um abismo nascer entre duas pessoas.
Não foi bom.
Deixei por ele saltar um pensamento;
ainda não ouvi barulho.

недеља, јул 17

Eu, que nunca fui de nenhum lugar, e me importo com pouca coisa, acho de muita lucidez Roubar Millôr Fernandes:

"...olhando pra esquerda ou olhando pra direita, estamos dentro de um palíndromo:
A MALA NADA NA LAMA ...".

PS:Recorra ao dicionário caso não entenda.
ou,
apenas não entenda.

субота, јул 16

Canção Pirâmide

O que eu vi quando mergulhei no lago?
Anjos caolhos nadavam ao meu lado
Uma lua estrelada e móveis astrais
Todas as coisas que antes já via
Todas as amantes que eu já conhecia
Todo o meu futuro e passado
E fomos pro céu num barco a remos
Nada temíamos e a duvidar esquecemos (...)

(de um cantor em desespero)
RECEITA

Ingredientes
2 conflitos de gerações
4 esperanças perdidas
3 litros de sangue fervido
5 sonhos eróticos
2 canções do beatles

Modo de preparar
dissolva os sonhos eróticos
nos 2 litros de sangue fervido
e deixe gelar seu coração

leve a mistura ao fogo
adicionando dois conflitos
de gerações às esperanças
perdidas

corte tudo em pedacinhos
e repita com as canções dos beatles
o mesmo processo usado com os
sonhos eróticos mas desta vez
deixe ferver um pouco mais e
mexa até dissolver

parte do sangue pode ser
substituído por suco de
gorselha mas os resultados
não serão os mesmos

sirva o poema simples ou com
ilusões

NIcolas Behr


http://www.tanto.com.br/nicolasbehr-livrinhos.htm

четвртак, јул 14

Acho que sou em camadas.
tiras bem finas, auto-fundamentadas e estrangeiras umas a outras.
Uma babel de desejos
essas vozes ( grunidos fora da inteligibilidade) discordantes lutam entre si,
e o que aparece
só uma vitória.

Declaro que esse estado de guerra civil permanente tem como causa a falta de um tradutor acoplado ao que estou desde que nasci.

понедељак, јул 11

O frio especial das manhãs de viagem,
A angústia da partida, carnal no arrepanhar
Que vai do coração à pele,
Que chora virtualmente embora alegre.

A. de Campos

субота, јул 9

Sentada.
Percebi que poderia ficar ali para sempre, ou que poderia ser sempre assim. Não havia ninguem, nem outro copo. E haviam muitos, conversavam, riam, bebiam.
Não que num primeiro momento tudo não me assustasse. Claro que nos primeiros cinco minutos olhei as horas 150 vezes.
Fumei, talvez, 20 cigarros.
Mas, rapido, passou.
Então li o mesmo poema. Ora em japonês, ora em português. AS vezes as letras japonesas vaziam mais sentido que todas as outras. Outras vezes, eram apenas milhares de tatuagens em potencial.
Li tudo em volta. Nada era familiar, tudo reconfortante. Nem estava mais só.
Acho que porque estava sentada.
e no poema dizia ( poesia é a mais pura verdade):
O mundo sente solidão por ficar de pé.

петак, јул 8

Há quem diga que eu dormi de touca
Que eu perdi a boca
Que eu fugi da briga
Que eu cai do galho e que não vi saída
Que eu morri de medo quando o pau quebrou

Há quem diga que eu não sei de nada
Que eu não sou de nada e não peço desculpas
Que eu não tenho culpa
Mas que eu dei bobeira
E que Durango Kid quase me pegou

Eu por mim queria isso e aquilo
Um quilo mais daquilo
Um grito menos nisso
É disso que eu preciso
Ou não é nada disso
Eu quero é todo mundo nesse carnaval

Eu quero é botar meu bloco na rua
Brincar, botar pra gemer
Eu quero é botar meu bloco na rua
Ginga pra dar e vender
(meu amigo de apartamento me deu essa música)

среда, јул 6

Os Outros Românticos

para Jorge Mautner



Eram os outros românticos, no escuro
Cultuavam outra idade média situada no futuro
Não no passado
Sendo incapazes de acompanhar
A baba Babel de economias
As mil teorias da economia
Recitadas na televisão
Tais irredutíveis ateus
Simularam uma religião
E o espírito era o sexo de Pixote então
Na voz de algum cantor de rock alemão
Com o ódio aos que mataram Pixote a mão
Nutriam a rebeldia e a revolução
E os trinta milhões de meninos abandonados do Brasil
Com seus peitos crescendo, seus paus crescendo
E os primeiros mênstruos
Compunham as visões dos seus vitrais
E seus apocalipses mais totais
E suas utopias radicais
Anjos sobre Berlim
"O mundo desde o fim"
E no entanto era um sim
E foi e era e é e será sim

(Caetano Veloso)

понедељак, јул 4

Um dia acordei e não tinha mais vontade de comer doce.
Foi como um desses fiapos
que um dia a gente larga pra trás sem quê nem porquê.
Sem ressentimento também. Aquilo que não nos acompanha pra sempre tem a rara cor da ausência.
Não tenho pressa. Mas a ansiedade dói como uma catástrofe.
Na casa do meu avô, as mesmas pedras me esperam, circunfudando o horizonte.
Um porre, uns cigarros,alguns sonhos e uma certa ambiguidade entre o amor e o amor.Os personagens dessa trama não conseguem mais entender a lingua em que foi escrito o roteiro. HOuve um descompasso irremediável entre o regente e os regidos, e num ato de subversão, tímido, mas inesgotável, as ondas do mar passam a seguir o pôr do sol.
Fico a boiar.
Vou jogar um novo olhar pela janela, e buscar um hiato entre a fenda e a discrição.

недеља, јул 3

Me colaram no tempo, me puderam uma alma viva e um corpo desconjuntado. Estou limitado ao norte pelos sentidos, ao sul pelo medo, a leste pelo Apóstolo São Paulo, a oeste pela educação. Me vejo numa nebulosa, rodando, solto sou um fluído, depois chego à consciência da terra, ando como os outros, me pregam numa cruz, numa única vida. Colégio. Indignado, me chamam pelo número, detesto a hierarquia. Me puseram o rótulo de homem, vou rindo, vou andando, aos solavancos. Danço. Rio e choro, estou aqui, estou ali, desarticulado, gosto de todos, gosto de ningém, batalho com os espíritos do ar, alguém da Terra me faz sinais, não sei mais o que é o bem nenhum mal. Minha cabeça vooa acima da baía, estou suspenso, angustiado, no éter, tonto de vidas, de cheiros, de movimentos, de pensamentos, não acreditoem nenhuma técnica. Estou com os meus antepassados, me balanço em arenas espanholas, é por isso que saio às vezes pra rua combatendo personagens imaginários, depois com os meus tios doidos, às gargalhadas, na fazenda do interior, olhando os girassóis do jardim. Estou no outro lado do mundo, daqui a cem anos, levantando populações... Me desespero porque não posso estar presente a todos os atos da vida. Onde esconder minha cara? O mundo samba na minha cabeça. Triângulos, estrelas, noite, mulheres, andando, presságios brotando no ar, diversos pesos em movimento me chamam atenção, o mundo vai mudar a cara, a morte revelará o sentido verdadeiro das coisas.


(Mapa... Murilo Mendes)

субота, јул 2

I Need Something



Yes, I need something
I always need something
If it's a love
Or if it's a drink
Oh hell, i don't know
I just need something.

Eu preciso de alguma coisa
Eu sempre preciso de alguma coisa
Se é um amor
Ou se é um drink
Ó diabo, eu não sei
Só sei que preciso de alguma coisa

Tá faltando alguma coisa
Sempre tá faltando alguma coisa
Se é de mudança
Se é de esperança
Ó diabo, não sei
Só sei que tá faltando alguma coisa

Essa insatisfação que a gente sente
Ou solidão permanente
Tem que estar faltando alguma coisa.

Raul Seixas

уторак, јун 21

Por que estou perplexa. Apenas quero deixar de querer tudo que quis até então. Perecer por extremos de uma falta absurda de nada. Esta banalidade me irrita. Nem sei, mas só tenho raiva.Todos esperam, mas eu sei que a revolução ja aconteceu, só não foi da forma que se esperava. Nada mais se reflete no espelho a não ser a vaga inconcretude de todo esse anacronismo.A quem importa se estamos na bélgica ou na India...é apenas uma nave fadada à um fracasso bobo e triste. A vida é a morosidade de uma ressaca, o gosto amargo de uma frustração que não deixou possibilidade, não poupou nenhum sentido, nem mesmo a falta de sentido.
E todos devemos ficar em casa para nos protegermos mutuamente das bobagens que se faz para acabar com o tédio.

петак, јун 17

"Nem sempre uma ejaculação (dormindo ou acordado) tem origem sexual. Eu, por exemplo, fico exitado com a letra A e tive sonhos úmidos por causa ela.: vejo-me penetrando-a, a luxúria a transforma num V, suas longas extremidades me apertam"

Efraim M Reys- Táticas de masturbação entre Batman e Robin

четвртак, јун 16

"Há muito tempo, há tanto tempo, então, desde sempre e pelo mesmo tempo que resta a vir, nós estaríamos em via de nos entregar a promessa desse animal em falta de si mesmo.
Há muito tempo, pois.
Há muito tempo pode se dizer que o animal nos olha?
Que animal?
O outro. "


Derrida.

понедељак, јун 13

Acho gracioso poder blasfemar contra o acaso. Estar cheia de ter me trancado dentro de meu quarto. Como quem não estranha mais as contradições, olho meu rosto e sinto uma raiva profunda de ter ido extrair o juízo.Ah, uma frescura hiperbólica!
Mas poucos sabem dar a devida importância ao inessencial...
Se pudesse, rezaria por um anjo que exterminasse a dor. Que a fizesse cessar, como um muro que desaba.
Mas meu princípio mora em outro lugar. É vertical.
Canta, dança e é extremamente mal humorado as terças e quintas.
Peões ou bispos... Nao sei o que isto significa. Eu não entendo, ele é maldoso.
E pode acontecer de ser exatamente o contrário.
Viro pro lado e tento dormir.São 4 da manha. Mas meu rosto não é rosto, e isto posto, não tenho grandes obrigações.

недеља, јун 12

Não posso falar. Faz um tempo que ja não escuto mais minha voz. Não é um grande desperdício. Estou poupando, a todos, da verdade que apenas meus olhos podem ver. Gostaria de estar livre da verdade de todos também. Estou farta de verdades. Prefiro águas turvas. Todo meu lado direito padece as dores de quem despreza a materialidade da vida.Paga o preço de negar a verdade provável de uma parede, de um buraco, de um dente. Sofre, então, resignadamente. Ao lado esquerdo, entretanto, apetece entregar-se ao ainda-nao cantado das sereias.

среда, јун 8

Sete chaves
Vamos tomar chá da cinco e eu te conto minha
grande história passional, que guardei a sete
chaves, e meu coração bate incompassado entre
gaufrettes. Conta mais essa história, me
aconselhas como marechal do ar fazendo
alegoria. estou tocada pelo fogo. Mais
roman à clé?
Eu nem respondo. Não sou dama, nam mulher
moderna.
Nem te conheço.
Então:
É daqui que tiro versos, desta festa- com arbítrio
silencioso e origem que não confesso-
como quem apaga seus pecados de seda, seus três
monumentos pátrios, e passa o ponto e as luvas.

Ana C. Cesar

среда, јун 1


Pouco a pouco o campo se alarga e se doura.
A manhã extravia-se pelos irregulares da planície.
Sou alheio ao espetáculo que vejo: vejo-o, É exterior a mim.
Nenhum sentimento me liga a ele.
E é esse sentimento que me liga à manhã que aparece.
A. Caeiro

понедељак, мај 30

Tudo o que nos acontece, tudo o que falamos ou nos é narrado, tudo quanto vemos com os nossos próprios olhos ou sai da nossa língua ou entra pelos nossos ouvidos, tudo aquilo a que assistimos (e por que, portanto, somos de certo modo responsáveis), há-de ter um destinatário fora de nós, e esse destinatário vai sendo seleccionado por nós em função do que acontece ou nos dizem ou então dizemos nós. Cada coisa deverá ser contada a alguém - nem sempre a mesma pessoa, não necessariamente -, e cada coisa vai-se colocando de parte como quem folheia e aparta e vai destinando prendas futuras numa tarde de compras.
Tudo deve ser contado pelo menos uma vez, ainda que, como havia determinado Rylands com a sua autoridade literária, deva ser contado segundo os tempos. Ou, o que vem a dar no mesmo, no momento justo e às vezes nunca mais se não se soube reconhecer ou se deixou passar deliberadamente esse momento preciso. Esse momento apresenta-se às vezes (a maioria das vezes) de maneira imediata, inequívoca e compulsiva, mas muitas outras vezes apresenta-se apenas confusamente e ao fim de lustros ou décadas, como acontece com os grandes segredos. Mas nenhum segredo pode ou deve ser guardado para sempre do conhecimento de toda a gente, é forçoso que encontre pelo menos um destinatário uma vez na vida, uma vez na vida desse segredo.É por isso que algumas pessoas reaparecem.É por isso que nos condenamos sempre por aquilo que dizemos. Ou por aquilo que nos dizem.

Javier Marías, in 'Todas as Almas'


PS: ONDE ESTÃO VCS?

уторак, мај 24

Aqui está minha vida.
Esta areia tão clara com desenhos de andar
dedicados ao vento.
Aqui está minha voz,
esta concha vazia, sombra de som
curtindo seu próprio lamento
Aqui está minha dor,
este coral quebrado,
sobrevivendo ao seu patético momento.
Aqui está minha herança,
este mar solitário
que de um lado era amor e,
de outro, esquecimento.

Cecília Meirelles

понедељак, мај 23

Deus triste

Deus é triste.
Domingo descobri que Deus é triste
pela semana afora e além do tempo.

A solidão de Deus é incomparável.
Deus não está diante de Deus.
Está sempre em si mesmo e cobre tudo
tristinfinitamente.
A tristeza de Deus é como Deus: eterna.

Deus criou triste.
Outra fonte não tem a tristeza do homem.


CDA

субота, мај 21

"Felizes os que não falam; porque se entendem "

Mariano Larra

среда, мај 18

Não passou


Passou?
Minúsculas eternidades
deglutidas por mínimos relógios
ressoam na mente cavernosa.

Não, ninguém morreu, ninguém foi infeliz.
A mão- a tua mão, nossas mãos-
rugosas, têm o antigo calor
de quando éramos vivos. Éramos?

Hoje somos mais vivos do que nunca.
Mentira, estarmos sós.
Nada, que eu sinta, passa realmente.
É tudo ilusão de ter passado.

CDA

петак, мај 13

Tenho uma tensão de sentimento.É estranho, não me impele. Algo resignado. Impressão de que não poderia ser diferente, posto que se fosse,não o seria. Me calo.
Tantos sons. Tanta banalidade.
Me calo.
(não. Isto é absurdamente uma mentira. Tagarelo inutilidades.me desperdiço.)
Sei que inventei tal tensão. Inutil? muito.
A verdade é que não há oposição entre o translúcido e o opaco. Inclusive, não há oposições.
Há somente desejo.
Ele ressoa, indefinível. Não quer se concretizar. Desejo de desejo é feitiço, artificialidade. Não é nem deixa de ser. Não tem objeto, não se dirige a nada, nem quer conquistar o mundo. Desejo pleno é só prazer dor numa dimensão onda nada mais se distingue. E tudo, que eu digo falo penso, já não corresponde à essa angústia. Já não corresponde a nada. Não tenho nada a dizer sobre o mundo.
No entanto, escrevo falo penso todo o tempo.É preciso suportar o silêncio. Suportar o tempo. É só para existir que existe a expressão. Ainda que nada de fundamental possa ser dito.
(...!)
é preciso distrair-se, divertir, fixar, transbordar.

четвртак, мај 12

Poética



Estou farto do lirismo comedido
Do lirismo bem comportado
Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente
protocolo e manifestações de apreço ao Sr. diretor.
Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionário
o cunho vernáculo de um vocábulo.
Abaixo os puristas
Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais
Todas as construções sobretudo as sintaxes de exceção
Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis
Estou farto do lirismo namorador
Político
Raquítico
Sifilítico
De todo lirismo que capitula ao que quer que seja fora de si mesmo
De resto não é lirismo
Será contabilidade tabela de co-senos secretário do amante
exemplar com cem modelos de cartas e as diferentes
maneiras de agradar às mulheres, etc
Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbedos
O lirismo difícil e pungente dos bêbedos
O lirismo dos clowns de Shakespeare


— Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.


Manuel Bandeira

понедељак, мај 9

Ápice


O raio do sol da tarde

Que uma janela perdida

Refletiu

Num instante indiferente —

Arde,

Numa lembrança esvaída,

À minha memória de hoje

Subitamente...





Seu efêmero arrepio

Ziguezagueia, ondula, foge,

Pela minha retentiva...

— E não poder adivinhar

Porque mistério se me evoca

Esta idéia fugitiva,

Tão débil que mal me toca!...



— Ah, não sei porquê, mas certamente

Aquele raio cadente

Alguma coisa foi na minha sorte

Que a sua projeção atravessou...





Tanto segredo no destino de uma vida...





É como a idéia de Norte,

Preconcebida,

Que sempre me acompanhou...


Sá Carneiro

среда, мај 4

Estou cansado, é claro,
Porque, a certa altura, a gente tem que estar cansado.
De que estou cansado, não sei:
De nada me serviria sabê-lo,
Pois o cansaço fica na mesma.
A ferida dói como dói
E não em função da causa que a produziu.
Sim, estou cansado,
E um pouco sorridente
De o cansaço ser só isto —
Uma vontade de sono no corpo,
Um desejo de não pensar na alma,
E por cima de tudo uma transparência lúcida
Do entendimento retrospectivo...
E a luxúria única de não ter já esperanças?
Sou inteligente; eis tudo.
Tenho visto muito e entendido muito o que tenho visto,
E há um certo prazer até no cansaço que isto nos dá,
Que afinal a cabeça sempre serve para qualquer coisa.

Álvaro de Campos

среда, април 27

"A pior das loucuras é, sem dúvida,
pretender ser sensato num mundo de doidos."
Erasmo de Roterdão.

понедељак, април 25

Eu expando, logo sou.
Mas nunca existi, a não ser em alguma história que eu mesmo inventei pra distrair do tédio que me causa a concretude, tão grosseira e cansativa.
Por que é tão provisório este ser de parte alguma, este não-lugar, esta estrada...
Não tenho casa e me lanço.Enlaço.
Eterna fixação nas possibilidades infinitas que se abrem a um horizonte vazio e azul.
Sem amargura.
Sei que ser partido é ter que partir sempre rumo a vastidão inalcançável.
Este mundo entremundos...sem limites, sem finalidade.
Esta margem do meio...
Esta ânsia que é azia e gozo.
Este maremoto que causo todos os dias em um copo d’água.
Este teu sorriso quase velado, teu silêncio, teus olhos e suas mãos...Não, não é paixão. È mais um repousar ardente, efêmero, no inefável.
_ não faz sentido. Eu sei.

уторак, април 19

Dois caminhos eternamente paralelos. Reconhecimento e desconhecimento. clareza e obscuridade. cebtro e margem. legitimo e bastardo. Em casa e expatriado. trajeto interminável, intraduzível. Vontade de não estar em nenhum lugar. Furiosa amolação isso de ver a vida com essa pertubadora nitidez. Ha quem importa...Nos transformamos em alguem imprevisto, e tudo fica para trás. Por fim, ha sempre um novo povo, um outro corpo, outro outro qualquer, sedento de prazeres, pura e simplesmente bárbaro, disposto a desfrutar dos despojos dos vencidos, a rir-se, a rir de si.
Desnecessária catastrofe indecídivel. A vida toda cheia do que não existe. Muito mais importante do que o que existe, o que existe nao importa, eu ja tenho. Mistura indestrinçável, onde reúno e fundo, eu e minhas voliçoes confusas, ambuiguas. tudo é instavel e suspenso.
Até entao, pelo menos.
Diante de,
Vou ao Rio. Vou ao Rio.

петак, април 15

Oriente

Se oriente, rapaz
Pela constelação do Cruzeiro do Sul
Se oriente, rapaz
Pela constatação de que a aranha
Vive do que tece
Vê se não se esquece
Pela simples razão de que tudo merece
Consideração
Considere, rapaz
A possibilidade de ir pro Japão
Num cargueiro do Lloyd,
lavando o porão
Pela curiosidade de ver
Onde o sol se esconde
Vê se compreende
Pela simples razão de que tudo depende
De determinação
Determine, rapaz
Onde vai ser seu curso de pós-graduação
Se oriente, rapaz
Pela rotação da Terra em torno do sol
Sorridente, rapaz
Pela continuidade do sonho de Adão.

(Gilberto Gil)

уторак, април 12

Confissão
Não amei bastante meu semelhante,
não catei o verme nem curei a sarna.
Só proferi algumas palavras,
melodiosas, tarde, ao voltar da festa.

Dei sem dar e beijei sem beijo.
(Cego é talvez quem esconde os olho
sembaixo do catre.) E na meia-luz
tesouros fanam-se, os mais excelentes.
Do que restou, como compor um homem
e tudo que ele implica de suave,
de concordâncias vegetais, murmúrios
de riso, entrega, amor e piedade?
Não amei bastante sequer a mim mesmo,
contudo próximo. Não amei ninguém.
Salvo aquele pássaro – vinha azul e doido –
que se esfacelou na asa do avião.

CDA

недеља, април 10

Qualquer pessoa com alguma inteligencia sabe que está a levar uma estúpida, qualquer que seja ela. Nada há de especial nisso. Simplesmente não há outra forma de vida, se se tem consciência dela.
Submerso na inconsciência, bestialmente, talvez fosse possível sorver o vivido. O resto, excremento intelectual, não é mais do que uma superficialidade, essa claridade esverdeada, precipício transparente.Nisso, vivemos.

субота, април 9

“No merídio da linguagem, o espírito apaixonado estava preso na metáfora: poeta sem relação com o mundo a não ser pelo estilo de impropriedade.”
Jacques Derrida

четвртак, април 7

Boas Novas
Poetas e loucos aos poucos
Cantores do confins
E mágicos das frases
Endiabradas sem mel
Trago boas novas
Bobagens num papel
Balões incendiados
Coisas que caem do céu
Sem mais nem por que
Queria um dia no mundo
Poder te mostrar o meu
Talento pra loucura
Procurar dores no peito
Eu sei que sou perfeito
Pra fazer discursos longos
Fazer discursos longos
Sobre o que não fazer
Que é que eu vou fazer?
Senhoras e senhores
Trago boas novas
Eu vi a cara da morte
E ela estava viva
Eu vi a cara da morte
E ela estava viva
Criei milhares de metáforas
E nada lhe falei
Das tripas coração
Do medo
Minha oração
Agarrei com Deus a cada hora da partida
Na hora da partida
Tiros de vamos pra vida
Então vamos pra vida
Senhoras e senhores
Trago boas novas
Eu vi a cara da morte
E ela estava viva
Eu vi a cara da morte
E ela estava viva
(Cazuza)

среда, април 6

Espalhava mar em mãos, em pés e em olhos. Vislumbrava persistentemente a ilha. Mesmo exausto vislumbrava-a. Afogaria-se ao sonho da ilha ou a alcançaria? Não importava mais, pois nem mesmo ilha tinha certeza ser a ilha. Ilusão naufraga, utopia, paraíso ou só mais uma ilha, pouco lhe importava o que a ilha realmente seja. Sua sobrevivência depende da ilha, da busca pela ilha. Sem esta busca não seria mais naufrago, não mais um sobrevivente, perderia sua identidade, acabaria-se. Uma vez chegando a ilha, nunca mais o naufrago retornaria ao mar. Não haveriam mais barcos a o ajudar em sua travessia, nem barcos a salvá-lo, nem mesmo os barcos que ao seu lado navegavam atentos. E caso cedessem os braços as correntezas e a maré seria ele aportado a ilha? Poderia então esta ser deserta? Poderiam habitar pessoas hostis? Não saberia dizer, a ilha é sempre distante. Incerta. Mas nem ao menos sabemos se a ilha existe. E se existir seria uma acolhida ou uma expulsão? São tantas as possibilidades que o naufrago nunca esteve sozinho. Por fim cansou-se sem estafa deixando-se levar ao fundo do mar. Então calmamente levantou-se e caminhou sobre as águas. Não havia ele imaginado que as águas poderiam ser rasas.

уторак, април 5

Entre perdas e esquecimentos, contabilizo:
_ 3 queridos
_ meu caderno
_ pasta
_carteira
_talao de cheque/cartão de banco
_ uns 60$
_chave de casa
_ porta níquel
_sombrinha
... em casa, som, livros, cigarrro,TV, leve embriaguês, alguma angústia, alguma insônia...clichês:
Eu perco o chão
Eu não acho as palavras
Eu ando tão triste
Eu ando pela sala
Eu perco a hora
Eu chego no fim
Eu deixo a porta aberta
Eu não mora mais em mim
Eu perco as chaves de casa
Eu perco o freio
Estou em milhares de cacos
Eu estou ao meio
Onde será que você está
Agora?

недеља, април 3


Lépida e leve
Gilka Machado


Lépida e leve

em teu labor que, de expressões à míngua,
O verso não descreve...
Lépida e leve,
guardas, ó língua, em seu labor,
gostos de afagos de sabor.

És tão mansa e macia,
que teu nome a ti mesmo acaricia,
que teu nome por ti roça,
flexuosamente,como rítmica serpente,
e se faz menos rudo,
o vocábulo, ao teu contacto de veludo.

Dominadora do desejo humano,
estatuária da palavra,
ódio, paixão, mentira, desengano,
por ti que incêndio no Universo lavra!...
És o réptil que voa,
o divino pecado
que as asas musicais, às vezes, solta, à toa,
e que a Terra povoa e despovoa
,quando é de seu agrado.

Sol dos ouvidos, sabiá do tato,
ó língua-idéia, ó língua-sensação,
em que olvido insensato,
em que tolo recato,
te hão deixado o louvor, a exaltação!

— Tu que irradiar pudeste os mais formosos poemas!
— Tu que orquestrar soubeste as carícias supremas!
Dás corpo ao beijo, dás antera à boca, és um tateio de alucinação,
és o elástico da alma... Ó minha loucalíngua,
do meu Amor penetra a boca,
passa-lhe em todo senso tua mão,
enche-o de mim, deixa-me oca...
— Tenho certeza, minha louca,
de lhe dar a morder em ti meu coração!

...Língua do meu Amor velosa e doce,
que me convences de que sou frase,
que me contornas, que me veste quase,
como se o corpo meu de ti vindo me fosse.
Língua que me cativas, que me enleiasos surtos de ave estranha,
em linhas longas de invisíveis teias,
de que és, há tanto, habilidosa aranha...

Língua-lâmina, língua-labareda,
língua-linfa, coleando, em deslizes de seda...
Força inféria e divina
faz com que o bem e o mal resumas,
língua-cáustica, língua-cocaína,
língua de mel, língua de plumas?

...Amo-te as sugestões gloriosas e funestas,
amo-te como todas as mulheres
te amam, ó língua-lama, ó língua-resplendor,
pela carne de som que à idéia emprestas
e pelas frases mudas que proferes
nos silêncios de Amor!...

уторак, март 29

Diante do tédio profundo, aleatoriedades absurdas sempre que possível.
Deslocar-se é só uma pausa. Vazio negro no mesmo branco perpétuo. ou vice-versa.

недеља, март 27

Frio, expatriado, cego, permanentemente em luto.Condenado por desamor a vagar pela rua, no meio da margem. Condena-lo a vê-las, todas elas. Todos os dias.
As mãos dos anjos não me consolam. Abismo raso, sem perdão.
Saio. Procuro por elas. Enfureço-me. Falo, discurso, quase desculpo-me. Ele não se levanta mais. Agora, sou apenas um escroto deprimido.
Berro solitário. Não há nem eco.
Eu sei que essa noite lentamente agoniza, como eu. Apenas mais um, transfigurado, transformado, retorcido, estuprado, pasteurizado, processado, industrializado, embalado e finalmente, congelado em pequenos pedaços para que em doses homeopáticas me torne vivo.

петак, март 25

четвртак, март 24

“O que é belo é bom, e o que é bom depressa será também belo."
Safo

среда, март 23

Ninguém é alguém, sou deus, sou herói, sou filósofo, sou demónio e sou o mundo, o que é uma forma cansativa de dizer que não sou.

(sou livre? )

A morte (ou a sua alusão) torna os homens delicados e patéticos. Estes comovem-se pela sua condição de fantasmas. Cada acto que executam pode ser o último. Não há um rosto que não esteja por se desfigurar como o rosto de um sonho. Tudo, entre os mortais, tem o valor do irrecuperável e do perdido. Entre os Imortais, pelo contrário, cada acto (e cada pensamento) é o eco de outros que no passado o antecederam, sem princípio visível, ou o claro presságio de outros que, no futuro, o repetirão até à vertigem. Não há coisa que não esteja perdida entre infatigáveis espelhos. Nada pode ocorrer uma só vez, nada é primorosamente gratuito. O elegíaco, o grave, o cerimonial, não contam para os Imortais. Homero e eu separamo-nos nas portas de Tânger. Creio que não nos despedimos.

Ser imortal é coisa sem importância. Excepto o homem, todas as criaturas o são, porque ignoram a morte. O divino, o terrível, o incompreensível, é considerar-se imortal.

Jorge Luís Borges, in "O Imortal"

уторак, март 22

Considerava-se intrinsecamente um anarquista. Compactuava plenamente com a possibilidade do ir e vir, com a irremediável liberdade do ser que se vê livre. Mas num desses vingativos refluxos de mundo se viu obrigado a usar todas suas identificações; CPF, Certificado de Reservista, Titulo de Eleitor (que a propósito havia sido usado na eleição de Luiz Inácio para presidente). Como o objetivo parecia-lhe interessante procurou-os. E procurou mais e mais, até que o pequeno quarto não permitisse que nada mais fosse encontrado. Por fim desistiu da procura atendo-se ao problema. Matou o cachorro e, ai sim, caminhou liberto em direção a porta.

понедељак, март 21

Como vai?
Difícil responder.Tudo cinza.
?
(...)
Desencantado?
É.
( é por que de tudo o que pode faltar o mais grave é a importância da falta. ausência de desejo? é.)
Por que?
A mesa do bar tornou-se mesquinha.
e o mundo (não) foi mais o mesmo...

недеља, март 20

Tente não ocupar sua vida em odiar e ter medo.

Stendhal

четвртак, март 17

Café Philó
Grandes indagações filosóficas

A natureza é uma obra de arte? A revelação da unidade. Em face do consenso, a salvação passa por uma revolução? O cão. O amor é falta ou plenitude? A felicidade é nosso único objetivo? Haha, vida, o passeio perfeito. O Estado é inevitável? O maldito. A memória é o futuro do homem? Inspirador. Estamos perdendo a razão? A razão em marcha? Somos dignos de ser livres? A inocência perdida. Podemos fugir as nossas responsabilidades? Tribunal. A ciência sem consciência está condenada? Arborescência em zigue-zague. Toda verdade é ilusória? O pragmético. Deus, das almas ou das armas. Deus, o que fazer com este Ser? Dar-lhe a máscara do ente. Desde quando o progresso ficou louco? O moderno deve compreender o mal? Crer. A incerteza é a única certeza? O mundo dos possíveis. Existe vida após a morte? Cicuta. História tem sentido? O céu das Idéias.

среда, март 16

Pedabobia

A construção do nada. Que belo assunto! Cada um vai construir seu próprio nada durante todo o semestre.Sublime tarefa: Vamos escolher o conteúdo do nada, os princípios e fundamentos do nada. Hahahaha. vamos desenvolver a capacidade de análise crítica do nada: vamos nos localizar diante do nada, e qualificar o nada no qual estamos inseridos.Estaremos então finalmente aptos a transmitir didaticamente correto o nada.
E então, (professorinha sorridente adestrada no discurso do gerundio sem fim):" é isso que eu tava querendo estar apresentando pra vcs:
o nada,
nadificando,
nadando."

недеља, март 13

O Sonho Febril da Realidade

A verdade acerca do mundo, disse ele, é que tudo é possível. Não fosse o caso de vocês se terem habituado desde a nascença a ver tudo aquilo que vos rodeia, esvaziando assim as coisas da sua estranheza, e a realidade surgiria aos vossos olhos tal como é, um truque de magia num número de ilusionismo, um sonho febril, um transe povoado de quimeras sem analogia nem precedente imaginável, um carnaval itinerante, um espectáculo de feira migratório cujo derradeiro destino, depois de montar a tenda tantas e tantas vezes em tantos baldios enlameados, é tão indescritível e calamitoso que o espírito humano não consegue sequer concebê-lo.

O universo não é uma coisa limitada e a ordem que o rege não tem peias que, tolhendo-lhe os desígnios, a forcem a repetir noutro lugar qualquer o que já existe num dado lugar. Mesmo neste mundo, existem mais coisas que escapam ao nosso conhecimento do que aquelas que conhecemos e a ordem que os nossos olhos vêem na criação é a ordem que nós lá pusemos, qual fio num labirinto, para não nos perdermos. É que a existência tem a sua própria ordem e essa nenhum espírito humano consegue abarcar, sendo esse espírito apenas mais um facto entre tantos outros.

Cormac McCarthy, in 'Meridiano de Sangue'
Para exprimir espremo-me.
Há um ano, muito neste caderno.
Miro-me. O que vejo não sei. Me desencontro. O que encontro, falta. Nada coincide em meu querer. Mas quero tanto...No fundo, perco o que procuro todos os dias. Destino de quem é somente desejo é viver apenas as extremidades da vida. Transfiguro, oscilo,desperdiço, derramo deslumbre e erros por caminhos que invento-percorro. Negocio com as exigências brutas da vida. Tento delas deleite, tentações, chateações: Vida.

Tanta coisa mudou.E no entanto, nada.
POr que escrevo? por que?

"Escrever é também não falar. É calar-se. É gritar sem ruído."
Marguerite Duras

петак, март 11

Uma abelha pousou em meu vinho. Rodeou as bordas por algum tempo. Gesteou com as asas. Deixou seu cheiro que a mim pareciam flores. Fez carinho em meu dedo e partiu. Plainou rodopiante e tudo o que eu desejava era que pousasse em minha boca. Mas parecia embriagada e em círculos se despediu. Me entristeceu que mesmo na embriagues minha boca não cheirasse flores para ela.

1 ano de idas e vindas
um ano.
um ano desse blog.
vamos comemorar?
hoje?
cerveja?

"embriaguês sagrada, afirmamo-te método."

среда, март 9

"A definição de belo é fácil: é aquilo que desespera"
Paul Valéry

понедељак, март 7

A gente descobre e vive com a alegria de quem trombou ao acaso com um livro ou uma pessoa fantástica.
Outro dia trombei com Adélia Prado num sebo. Achei tão bom que dei de presente.


Ensinamento

Minha mãe achava estudo
a coisa mais fina do mundo.
Não é.
A coisa mais fina do mundo é o sentimento.
Aquele dia de noite, o pai fazendo serão,
ela falou comigo:
"Coitado, até essa hora no serviço pesado".
Arrumou pão e café, deixou tacho no fogo com água quente,
Não me falou em amor.
Essa palavra de luxo.

Adélia Prado
"A apresentação do outro como tal só pode ser a dissimulação de si como tal."
Derrida

недеља, март 6

Sofro de naúsea imaterial.
Antevejo a desilusão. Respiro o fracasso da nossa espécie. Invento vidas para despertar botões. Desfiguro-me. Exalto-me. Despedaço. Me escondo atrás do que não vivi.Tropeço em pedras inquietas indecisas, inexistentes. COnstrui ruínas pelas quais rastejo, e sem pressa, faço com que não percebam que a rua sem saída é na verdade uma bela alameda. Ainda que seja raso e mediocre, visto-me de abismo obscuro e viscoso. Um poço de falsas reflexões e meias verdades.
Não se trata de uma falha de caráter, mas de um sentido intelectual-estético. Apenas uso certas máscaras. E não outras. Não vejo grande distancia entre ser esse postiço ou outro postiço qualquer. Traio-me ao trair. Desapareço ao sentir.
Se me crio é por que me desconheço.Se te crio, é por que pertenço-te.

субота, март 5

Queridos,
pra que tanta chuva?

четвртак, март 3

Respiro agora fora do tédio. carnaval de ações, bacanal de propósitos. Convulsão. eletricidade.

Dos momentos que respiro fora do tédio.
Não, eles não tem por quê. O impulso surge.Sublimimente meu. Tâo do acaso. Irrompe a inércia. Desloca limites.
Fortuna.
Despeço, da naúsea, da impotência, da ira.
Agora, sou deus.


só estou explosão, por que ja não tenho noção da realidade.

среда, март 2

PARA A FAE

O Hierofante

Não há possibilidade
De viver com essa gente
E nem com nenhuma gente
Nem com nenhuma gente
A desconfiança te cercará
Como um escudo
Pinte o escaravelho de vermelho

E tinge os rumos da madrugada
E tinge os rumos da madrugada
Irão de longe as multidões suspirosas

Escutar o bezerro plangente ti ti ti tiriri ririri
Tiriri ririri tiriri ririri tiriri ririri ri...
Lá lálálá lá lá... lá lálálá lá lá...

Lá lá lá lá lá lá lá...
Não há possibilidade
De viver com essa gente
E nem com nenhuma gente
Nem com nenhuma gente
A desconfiança te cercará
Como um escudo
Pinte o escaravelho de vermelho